segunda-feira, 9 de janeiro de 2012


HUMOR LUSITANO

O humor é uma das manifestações mais caras à intervenção política de um povo, especialmente em períodos de crise e/ou falta de liberdade. É uma espécie de vacina contra as dificuldades, contra o medo. Porque o medo é uma das mais poderosas armas políticas. Nas ditaduras, mas também em democracias em crise, como que a prepararem o salto para uma imagem mais musculada… Para ditaduras, como foi a nossa de 1926 a 1974, ou para democracias cada vez mais envergonhadas – ou desavergonhadas? – como esta se está a tornar. Com ajuda exterior, é verdade, mas sem desculpas que lhe valham.
Bocage aparece como um dos protagonistas – reais ou imaginários – de um humor político-social mas, principalmente, brejeiro e escatológico muito corrosivo, muito português. Não havia, no tempo de Bocage, uma ditadura no sentido actual, mas Pina Manique era o símbolo da repressão absolutista das ideias, das Luzes que então brilhavam sobre a Europa.
O fascismo salazarista mais incentivou essa vocação tão lusitana de contar piadas, e as anedotas do ditador de Santa Comba, algumas protagonizadas também pelo falecidíssimo Bocage, foram uma explosão de criatividade ímpar.
Mas a democracia pós-Troika – permitam-me que assim caracterize esta tão… surpreendente democracia – arrisca-se a bater todos os recordes no domínio da caricatura, pois nunca se viu uma tão coesa associação de cérebros – passe a expressão – de tal forma insensíveis ao destino do seu país e do seu povo, como estes ministros, do Primeiro ao último. E pairando nas alturas, o mais alto magistrado, a aproveitar feriados e efemérides para recomendar, sempre e sempre, concertação, consenso, concertação, consenso, belas ideias num momento em que nada as faz prever…
 A única coisa que parece interessar a estas benditas mentes é estar nas boas graças dos autoproclamados senhores da Europa e dessas entidades, tão abstractas na denominação como concretas nos malefícios, que são os famigerados mercados!
Sobre tais senhores – uns e o outro – quaisquer anedotas não passarão de simples redundância, pois visitar hospitais a prometer um bom ano para a saúde e a salvação do Serviço Nacional de Saúde, quando na verdade o fecha à maioria da população, como se esta tivesse meios para procurar no Privado aquilo que o Estado lhe recusa, só pode ser uma piada de mau gosto. Ou esperar um futuro ressurgimento económico depois de provocar a destruição da indústria e da agricultura, o desemprego de camadas cada vez maiores da população e a aniquilação da frota de pesca do país com maior área de águas territoriais, supera todos os limites. Para não falar na redução da educação à lei da selva, como acontece no Ensino Superior onde o Estado se demitiu das suas responsabilidades, esperando que cada escola se baste a si mesma e assim atinja a Excelência. Ou recomendar a emigração à juventude, a cereja em cima do bolo!
É tão estúpido e torna-se tão triste, que apenas o génio louco deste povo de tão aparentemente brandos costumes poderá aventurar-se a fazer um trocadilho que seja sobre esta raça de gente que do alto dos seus cadeirões vai destruindo tudo aquilo que tanto custou a construir.
Anedotas? Com um Coelho carnívoro que parece saído da gruta dos Monty Pyton? Só com um corta-Relvas!