O Templário, 15-1-2015
Charlie
somos todos nós
Os actos terroristas que, desde o dia 7 de Janeiro, enlutam a França e todo o
mundo livre, tiveram a sua resposta com a gigantesca manifestação que juntou em
Paris, com a multidão de cidadãos que encheram as suas ruas, os governantes e
representantes de uma boa parte da Europa e de numerosos países do mundo.
Essa união dos que entenderam a gravidade
dos crimes cometidos e que, independentemente das suas diferenças políticas,
souberam unir-se, mesmo que provisoriamente, numa grande jornada de massas, é
um sinal de que há ainda alguma esperança de que valores como o da liberdade de
expressão sejam ainda suficientemente motivadores de ânimos e vontades,
especialmente nesta nossa Europa tão aviltada por egoísmos nacionais e
económicos.
E, acima de tudo, neutralizem o medo que assim se procurou incutir nas
sociedades abertas do mundo civilizado, impondo-lhes – como foi já dito por
“responsáveis” jiadistas – “limites à liberdade de expressão”.
A revista Charlie Hebdo, sempre se
notabilizou pela sua liberdade de crítica, em que política e religião foram
implacavelmente satirizadas sempre que aos cartoonistas sobravam razões para
isso.
A morte de Wolinski, Jean Cabut,
Charbonnier e Tignus, os mais representativos dos seus desenhadores, torna o
mundo da sátira política mais pobre, mas não parece ter assustado a maioria dos
seus colegas por essa Europa fora, indignados, solidários e prontos a desafiar
o terror com a lufada de ar fresco dos seus desenhos, do seu humor.
O homicídio da maioria do corpo
redatorial de Charlie, além de outro pessoal da revista e polícias, foi engrossado pelas acções
terroristas subsequentes que mataram reféns em França e incendiaram e
destruiram o arquivo da publicação alemã Morgen Post, “culpada” de ter também
publicado alguns cartoons.
As reacções do outro lado do
Atlântico tendem a parecer bastante tíbias, entrincheirados os ógãos de
comunicação numa autêntica fobia de ofender mesmo que minimamente, a fé
religiosa de tantos eleitores.
De facto, os Estados Unidos da
América, para além da condenação do terrorismo pelo seu presidente e das suas
declarações de solidariedade, não parecem excessivamente preocupados com a
afronta à liberdade de expressão que os crimes jiadistas comportam.
Não é o caso do “pai” da Frente
Nacional francesa, Jean-Marie Le Pen, que afirma peremptoriamente “Quanto a
mim, lamento, mas não sou Charlie”. Nem seria de esperar que um assumido
inimigo de Democracia viesse defender um órgão de comunicação que sempre se
manifestou contra os desígnios fascizantes do seu partido, aspecto em que parece mais coerente do que a sua filha
Marine, pouco interessada em perder popularidade num momento em que se sente
forte nos votos que ganhou e decerto pensa multiplicar com as intenções xenófobas
já assumidas de fechar as fronteiras e de propor um referendo a favor da pena
de morte.
Na verdade, está tudo em aberto e a
guerra civilizacional assim exacerbada prossegue: na Nigéria, com mais 20
mortos, por acção de uma menina de 10 anos armadilhada pelos repugnantes
“mártires”, os tais que sonham com as não sei quantas mil virgens que os virão
servir no outro mundo. Qual será a recompensa das mártires? – é caso para perguntar.
Por isso é uma lufada de ar fresco o
grande número de representantes de países islâmicos presentes na manifestação
de Paris. As suas bandeiras e declarações provam que não será com as acções
horríveis de uns quantos bandidos sedentos de sangue, que a grande maioria dos
muçulmanos alinharão.
Como todos os povos do mundo, é a
paz e o trabalho que procuram. Não nos deixemos cegar pelo ódio que os
terroristas tão habilmente semeiam e manipulam. Cada mesquita incendiada, cada
muçulmano agredido, é mais um argumento a favor do tal “estado islâmico” que
pretendem implantar no mundo.
Não prestemos nenhum serviço aos Le
Pen, nem aos dementados partidários do “califado” mundial. De momento, eles são
coincidentes nos seus interesses.
Fiéis aos nossos valores
democráticos e humanos, enfrentemos a tempestade. Com coragem.