A
PRAIA, OU FIM DE FÉRIAS
Carlos
Rodarte Veloso
“O Templário”, 11-10-2018
Está a
terminar o período dito de férias e este é um dos primeiros anos em que esse
conceito se esbate perante a lógica da minha nova situação perante o trabalho e
os tempos livres que, agora, teoricamente, são todo o tempo do mundo.
É essa a
lógica da aposentação, da qual me julgo totalmente merecedor, mas o facto de
dificilmente esse direito vir a beneficiar, em toda a sua extensão, as futuras
gerações, confere a toda a situação um amargo de boca, uma sensação de
injustiça, de fim de época, que vai reflectir-se no futuro da nossa
descendência.
Diz-se que
a falta de recursos se deve à quebra da demografia e, consequentemente, à
diminuição dos rendimentos investidos na segurança social, e a verdade é que,
sendo isso verdade, não adoça minimamente a pílula da quebra dos direitos das
futuras aposentações.
Os meus
filhos não terão condições tão vantajosas como os pais, e os meus netos ficarão
bem pior, enquanto os recursos – que os há! – que poderiam corrigir a situação
são canalizados para a capitalização de uma banca irresponsável e já
criminosamente habituada aos favores do Estado.
Mas isto
são apenas pormenores e, paradoxalmente, o panorama do gozo de férias parece
ser drasticamente melhor que o dos tempos passados, em que a organização de uma
simples viagem ou de uma estadia de família num local turístico, mesmo no
estrangeiro, parece não ter limites. Claro que a panaceia para as limitações económicas
das famílias é o crédito todo-poderoso, facilitado a um ponto inacreditável
pelas instituições financeiras, muitas vezes sem exigir sequer garantias
suficientes para evitar o papão real do “crédito malparado”. Para viagens, para
compra de viaturas, para compra de casas…
Apesar os
péssimos resultados dessa política, ainda hoje invocados a todo o momento. Mas
cada vez menos, que a memória prega-nos partidas, e é humano reincidir nos
erros do passado!
Estas
considerações, talvez de algum mau gosto no momento em que milhares de famílias
começam a enfrentar as dívidas à banca assumidas pelas suas discutíveis
escolhas, levam-me a recordar a férias de há uns anos, pagas dificilmente com
um orçamente muito apertado, mas que correspondiam quase a papel-químico, às
condições das actuais férias da classe média, sempre e sempre focadas na
loucura do turismo de mar e praia.
E para
quê? Para nos enervarmos dentro do carro, enquanto os miúdos gritavam no banco
de trás, na fila que nunca mais andava… Para esturricar na areia a ferver a
procurar caminho no meio de outros felizes veraneantes… Para pagar couro e
cabelo por uma cerveja morna… Para queimar os pés a saltitar entre corpos
queimados e arranjar um espaço onde pudéssemos alimentar tranquilamente o
melanoma. Para sermos felizes!
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