SERÁ QUE TODAS AS GREVES SÃO JUSTAS?
Carlos Rodarte Veloso
“O Templário”, 1 de Agosto de 2019
O direito à greve é um direito constitucional
indiscutível.
Mas, afinal, qual é a finalidade das greves? É,
desde que tiveram início estas interrupções do trabalho para a obtenção de
melhores salários ou melhores condições laborais, a última das opções perante a
ruptura do diálogo entre o patronato e os trabalhadores. É a “linha vermelha”
que, por princípio, só deverá ser atravessada quando as condições de diálogo chegarem
a um beco sem saída, esgotadas que estejam as condições do diálogo entre os
trabalhadores e a entidade empregadora.
No entanto, os efeitos da greve devem, sempre que
possível, afectar apenas os interesses das entidades intervenientes, não
prejudicando terceiros, especialmente outros trabalhadores cujos direitos de
cidadania fiquem assim prejudicados, de formas por vezes dramáticas.
Isso levou à criação da figura dos serviços
mínimos, os quais se aplicam às greves no sector da saúde, da higiene, da segurança
e outros vitais. Mesmo que discutíveis, tais greves têm tido lugar,
prejudicando principalmente as camadas mais desprotegidas da população.
Mas quando uma greve atinge globalmente a economia
e o próprio funcionamento estratégico de todo um país, aproveitando conjunturas
especialmente delicadas em termos políticos, como as vésperas de uma eleição,
uma época crítica pela existência do perigo de catástrofes naturais ou
provocadas, a própria conjuntura da presença no país de uma população flutuante
de visitantes estrangeiros, estão reunidas as condições para que o carácter
reivindicativo da mesma seja largamente ultrapassado e revele ambições que em
muito extravasam os motivos imediatos invocados.
E na verdade, depois de há pouco tempo os
trabalhadores de transportes perigosos terem obtido a satisfação de uma série
de reivindicações, voltarem agora com um crescendo imparável de novas
exigências, num momento complicado da vida nacional, com eleições legislativas
à porta, exércitos de turistas “invadindo” Portugal de Norte a Sul e o perigo
bem documentado de incêndios florestais, pergunto-me se há alguma consciência
por parte destes trabalhadores das consequências possíveis da sua
intransigência.
Ou se há mesmo essa consciência… quando nos
lembramos de que, uns meses antes do golpe de estado fascista que em 1973
derrubou e assassinou Salvador Allende, no Chile, teve lugar a “noite das
mangueiras compridas” em que foi cortado todo o abastecimento de combustíveis
aos serviços mais importantes de Santiago e, depois, das cidades de Concón e
Concepcion…
Não sendo partidário de teorias da conspiração, não
vejo esta acção como um perigo imediato para a independência do nosso País… Mas
a falta de combustíveis é matéria muito mais inflamável que a sua existência.
Mesmo com serviços mínimos, temos pela frente uma crise no acesso à saúde, no
abastecimento dos meios de combate aos incêndios, na mobilidade do turismo, na
“simples” vida dos nossos cidadãos, extremamente complicada a todos os níveis.
Assim será fácil às forças políticas da Direita
atribuir responsabilidades ao Governo, assim inquinando o diálogo político num
momento especialmente crítico do ano.
Que las hay, las hay…
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