sábado, 3 de agosto de 2019



SERÁ QUE TODAS AS GREVES SÃO JUSTAS?

Carlos Rodarte Veloso

“O Templário”, 1 de Agosto de 2019

O direito à greve é um direito constitucional indiscutível.
Mas, afinal, qual é a finalidade das greves? É, desde que tiveram início estas interrupções do trabalho para a obtenção de melhores salários ou melhores condições laborais, a última das opções perante a ruptura do diálogo entre o patronato e os trabalhadores. É a “linha vermelha” que, por princípio, só deverá ser atravessada quando as condições de diálogo chegarem a um beco sem saída, esgotadas que estejam as condições do diálogo entre os trabalhadores e a entidade empregadora.
No entanto, os efeitos da greve devem, sempre que possível, afectar apenas os interesses das entidades intervenientes, não prejudicando terceiros, especialmente outros trabalhadores cujos direitos de cidadania fiquem assim prejudicados, de formas por vezes dramáticas.
Isso levou à criação da figura dos serviços mínimos, os quais se aplicam às greves no sector da saúde, da higiene, da segurança e outros vitais. Mesmo que discutíveis, tais greves têm tido lugar, prejudicando principalmente as camadas mais desprotegidas da população.
Mas quando uma greve atinge globalmente a economia e o próprio funcionamento estratégico de todo um país, aproveitando conjunturas especialmente delicadas em termos políticos, como as vésperas de uma eleição, uma época crítica pela existência do perigo de catástrofes naturais ou provocadas, a própria conjuntura da presença no país de uma população flutuante de visitantes estrangeiros, estão reunidas as condições para que o carácter reivindicativo da mesma seja largamente ultrapassado e revele ambições que em muito extravasam os motivos imediatos invocados.
E na verdade, depois de há pouco tempo os trabalhadores de transportes perigosos terem obtido a satisfação de uma série de reivindicações, voltarem agora com um crescendo imparável de novas exigências, num momento complicado da vida nacional, com eleições legislativas à porta, exércitos de turistas “invadindo” Portugal de Norte a Sul e o perigo bem documentado de incêndios florestais, pergunto-me se há alguma consciência por parte destes trabalhadores das consequências possíveis da sua intransigência.
Ou se há mesmo essa consciência… quando nos lembramos de que, uns meses antes do golpe de estado fascista que em 1973 derrubou e assassinou Salvador Allende, no Chile, teve lugar a “noite das mangueiras compridas” em que foi cortado todo o abastecimento de combustíveis aos serviços mais importantes de Santiago e, depois, das cidades de Concón e Concepcion…
Não sendo partidário de teorias da conspiração, não vejo esta acção como um perigo imediato para a independência do nosso País… Mas a falta de combustíveis é matéria muito mais inflamável que a sua existência. Mesmo com serviços mínimos, temos pela frente uma crise no acesso à saúde, no abastecimento dos meios de combate aos incêndios, na mobilidade do turismo, na “simples” vida dos nossos cidadãos, extremamente complicada a todos os níveis.
Assim será fácil às forças políticas da Direita atribuir responsabilidades ao Governo, assim inquinando o diálogo político num momento especialmente crítico do ano.
Que las hay, las hay…

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