O SONHO DA RAZÃO PRODUZ MONSTROS
Carlos Rodarte Veloso
“O Templário”, 31 de Outubro de 2019
Há pouco mais de
dois anos publiquei, neste Jornal, um artigo sobre as jornadas de 1 de Outubro,
reinício da luta activa dos independentistas catalães, nas ruas de Barcelona e
por todo o seu território, pelo referendo com que tentaram legitimar
democraticamente o estatuto de independência para este rico e progressista
pedaço da terra ibérica.
As esperanças
desses dias foram totalmente goradas, primeiro pelo autoritarismo castelhano de
um galego de má memória, Mariano Rajoy, com o devido “respaldo” do seu rei,
Filipe VI, esperando-se agora, quando a “solução judicial” contra os dirigentes
desse movimento patriótico vinha dar alguma esperança de que um indulto ou,
simplesmente, a inteligência de não repetir erros do passado, poderia apaziguar
os ânimos e conduzir ao urgente diálogo.
Pelo contrário,
vemos os dirigentes independentistas presos condenados a pesadíssimas penas de
prisão, ao estilo da Santa Inquisição, e Puigdemont, o Presidente eleito,
chamado a Espanha para arcar com as consequências do seu “crime”, sem que o
actual dirigente socialista da Espanha tenha mexido uma palha para abrir o
urgentíssimo diálogo entre a ressabiada Espanha franquista e este heróico povo
que ainda consegue manter propósitos pacifistas apesar da repressão que
regressou em força às suas ruas.
A presença nas
manifestações de grupos extremistas e provocadores, vem dar ainda maior força à
necessidade de um diálogo urgente fraterno.
A memória
sangrenta da Guerra Civil, com os seus incontáveis mortos, poderá ser um pesado
dissuasor da clemência devida aos catalães independentistas, porventura um
perigoso agitar das águas em vésperas de dificílimas eleições… mas momentos
difíceis exigem dirigentes corajosos e com fortes convicções e capacidade de
diálogo, não dirigentes pusilânimes e borrados de medo, se me é permitida a
expressão pouco educada…
Goya, o pintor
das guerras napoleónicas e das suas atrocidades que, nos “Desastres da Guerra” e
nos “Fuzilamentos de 3 de Maio” plasmou toda uma denúncia arrepiante dos males
da guerra, representara já, graficamente, poucos anos antes, nos seus
“Caprichos” cuja primeira gravura, “El sueño de la razón produce monstruos”, os
perigos do domínio do irracional sobre a razão, associada aquela aos piores
horrores que assombraram e continuam a assombrar a humanidade.
Esses desenhos e
pinturas proféticas parecem prever com uma arrepiante precisão, essa outra
guerra, a que atrás me refiro, a Guerra Civil de Espanha de que outros grandes
pintores espanhóis como Dalí e Picasso, deixaram testemunhos, respectivamente a
“Premonição da Guerra Civil”, de 1934 a 1936, e a famosíssima “Guernica” de
1937.
Aí se regressa a Goya e aos seus terríveis fantasmas, com os pesadelos
que, pelos vistos, fazem ainda muitos espanhóis transpirar…
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