OS TRABALHADORES E O POVO
Carlos Rodarte Veloso
“O Templário”, 3 de Setembro de 2020
A insistência na
contestação do uso das máscaras de protecção anti- coronavírus por parte de
organizações diversas tanto de direita como de esquerda, um pouco por todo o
mundo, é um péssimo sintoma de um pensamento retorcido que não só assume
contornos no mínimo suicidários, como inscreve tais raciocínios dentro das mais
absurdas teorias da conspiração.
Afirmar-se a
“sujeição” à “ditadura da máscara” como uma inaceitável limitação da liberdade parece
tão ilógico como o seria defender a abolição dos cintos de segurança nos
automóveis ou a liberdade de usar o telemóvel na estrada, ou outros disparates
que não apenas conspirariam contra a própria segurança dos seus defensores – o
que seria o menor dos males, pois cada um deve ser responsável pelos riscos que
assuma correr – mas principalmente das inocentes vítimas dessa criminosa
imprudência, no limite vitimadora da sua própria família.
Esta argumentação
tem sido abundantemente defendida nas próprias redes sociais, elas
habitualmente tão avessas à simples lógica, mas neste caso exemplar, um número
crescente de defensores se ergue nas grandes praças deste mundo, assumindo
orgulhosa e estupidamente, a sua recusa das mínimas condições de segurança!
Dir-se-ia que
esta manifestação de arrojo, de “coragem”, felizmente de uma ainda minoria, configura
uma espécie de afirmação dos últimos suspiros de uma espécie condenada à
extinção, nós próprios...
Talvez a tão sábia
como cega Natureza que tão agredida tem sido, se apreste a conceder à espécie
humana a misericórdia da sua limitação aos recursos que tão depauperados têm
sido e não permitem alimentar as massas crescentes de famintos que invadem as
nossas cidades e as rotas de fuga dos grandes conflitos que ensanguentam um
número crescente de países.
Claro que são os
pobres as suas principais vítimas, que os ricos estão bem protegidos por detrás
dos muros que construíram nas fronteiras da fome, piedosamente escondidas pela
nova geração de ditadores de que são vanguarda os Trumps deste mundo.
E enquanto se
erguem as vozes cada vez menos tímidas dos inimigos do confinamento, eles
próprios ignoram ostensivamente os perigos derivados da sua recusa, quando
organizam espectáculos de massas ao arrepio de toda a prudência, preferindo
preencher a sua agenda política, como se as suas festas, tanto a nível oficial
como privado não oferecessem os perigos que enxergam nas actividades da
concorrência!
Conteúdos
diferentes e pseudo inócuos têm os desportos de massas, os bárbaros
espectáculos de toiros, festas religiosas e muitas das manifestações políticas
colectivas, de que é triste exemplo a Festa do Avante, que arvoram à categoria
de virtude cívica, ou tradicional, ou outra coisa qualquer, a manutenção dessas
actividades, como se elas representassem algo mais do que a sua simples
manifestação de força, confundindo-a demagogicamente com a própria salvação da
Democracia!
Esse mimetismo
artificial entre grandes manifestações de massas e a defesa dos interesses dos
trabalhadores e do povo, é um mal disfarçado alibi para excepcionalizar
comportamentos de risco
A própria
comparação, em pé de igualdade, entre as comemorações do 25 de Abril ou do 1º
de Maio, com a Festa do Avante é, no mínimo, altamente tendenciosa e abusiva.
A diferença entre
elas é não só de dimensão e de significado, sendo o 1º de Maio de nível
planetário e o 25 de Abril a grande Festa portuguesa da Liberdade, não sendo nenhuma
delas limitada aos interesses de qualquer Partido, Movimento, interesse
particular ou momento político e social.
Isso não implica,
obviamente, as necessárias cautelas nos comportamentos de risco. Apostamos
nisso as nossas próprias vidas.
A nossa
Democracia tem cometido erros, mas o menor não será decerto escamotear a
realidade. E a realidade é fundamental para se enfrentar os graves problemas da
Humanidade.
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