O BAILE DE MÁSCARAS DA SOBREVIVÊNCIA
Carlos Rodarte Veloso
“O Templário”, 9 de Abril de 2020
As
medidas de isolamento que gradualmente têm sido impostas pela maior parte dos
governos como forma de enfrentar o coronavírus, têm sido diferentemente aceites
pelas respectivas populações, indo da franca adesão e disciplina à anarquia mais
desbragada, tornando regra de comportamento a recusa de todas as regras
definidas pela Ciência e pelos respectivos governos.
Exceptuando
o caso de alguns governantes que teimosa e estupidamente negam as consequências
da pandemia, caso de Bolsonaro, até o negacionista da Ciência que Trump ainda é
se rende à gravidade da situação e procura tomar as medidas necessárias para
deter o vírus e assim salvar os seus eleitores, embora as suas horríveis
características pessoais o levem a actos de egoísmo inacreditáveis num tempo
trágico como este, quer desviando equipamentos médicos de protecção dos outros
países, mesmo de aliados, para os Estados Unidos, quer monopolizando a sua
própria produção dos mesmos, ou ainda, tentando comprar o exclusivo de futuras
vacinas produzidas ou previstas pelos laboratórios dos países que investigam a
cura para o surto epidémico, ao mesmo tempo que mantém o bloqueio de todos os
meios aos seus inimigos de estimação, o Irão e Cuba nomeadamente.
E
que dizer de Erdogan que literalmente roubou
– é o único termo aceitável! – um carregamento de material de protecção
comprado à China por diversas comunidades autónomas espanholas, e já pago, confiscado
na escala do respectivo avião em Istambul, sob o pretexto de fazer falta na
Turquia?! Ou, ainda mais inacreditável, da França, que desviou igualmente
material médico destinado aos países mártires que são a Espanha e a Itália?
Este
salve-se quem puder não é, felizmente dominante nas relações internacionais,
sendo notórios os actos de generosidade de alguns países para com outros, mesmo
pertencendo a áreas políticas diferentes e até antagónicas, com o envio de
médicos e outro pessoal de saúde para os países mais infectados, caso da Rússia
para a Itália, e ainda facilitando o comércio e, até, a venda massiva e, até a doação
de máscaras e outro material de protecção pela China.
Quanto às populações civis dos diversos
países, temos assistido incrédulos a comportamentos colectivos de alto risco,
quando vemos intermináveis filas de carros invadindo as estradas para gozar os
dias mais agradáveis de uma primavera que se anuncia, ou praias e outros
lugares de veraneio de todo desaconselhados pela concentração de povo que
propicia.
Também
a fuga de muitos possuidores de segunda habitação para zonas rurais ou
balneares, apesar da proibição legal de o fazerem, põe em grave risco a
situação das populações rurais envelhecidas, muito mais vulneráveis à infecção
pela pandemia, criando-se grave alarme social, por exemplo em França, mas
também na Itália e em Espanha.
Quanto
ao nosso país, apesar de uma razoável disciplina manifestada pela população em
geral, relativamente às regras definidas pelo estado de emergência que vivemos,
assiste-se com frequência a comportamentos desviantes, umas vezes pontualmente,
outras com uma frequência preocupante.
É
comum vermos pessoas equipadas com luvas de protecção e máscaras a manipular
produtos alimentares nos supermercados, como se fossem suficientes para evitar
o possível contágio, luvas lançadas para o chão nos parques de estacionamento,
ou concentrações de pessoas em número não autorizado.
As
autoridades policiais terão que suar bastante para inibir todos os
comportamentos de risco propiciados pelo período da Páscoa, em que a
sociabilização das festas familiares, embora condenadas pelas autoridades da Saúde,
entra em choque frontal com atitudes de generosidade manifestadas por figuras
públicas como Ramalho Eanes, ao disponibilizar o ventilador que lhe seria
atribuído, em caso de internamento, para “chefes de família”, portanto para os
responsáveis por mulheres, crianças e familiares mais jovens, pondo assim em
cheque a sua própria sobrevivência.
Cabe
aqui um parêntesis sobre esta atitude que, embora aparentemente muito louvável,
parece menosprezar o direito dos idosos à sobrevivência em favor das camadas etárias
mais jovens, como se houvesse uma linha de separação, a aceitação de um quase direito
ao abandono das gerações mais velhas.
A
própria utilização da expressão “chefes de família” implica a valorização do
conceito de patriarcado como um direito de origem bíblica, aqui invertido do
seu sentido original, em ambos os casos condenável, quer a favor, quer contra…
Senhor
General, com toda a consideração e simpatia que me merece, nem oito nem oitenta!
Quantos homens e mulheres idosos não têm ainda à sua responsabilidade filhos e
outros dependentes, tantas vezes maiores de idade, desempregados ou em vias
disso? Não seria preferível a assunção do direito à vida, independentemente da
idade e, evidentemente, de acordo com os desejos de cada um?
Independentemente
de todas as considerações a respeito deste tema, não estou a incluir nesta
ordem de ideias os gravíssimos problemas derivados das gigantescas migrações
que povoam os perigosíssimos campos de refugiados no Médio Oriente, na Turquia,
na Grécia e outras regiões, bombas-relógio prontas a explodir e a agravar a um
ponto inacreditável a sobrevivência das respectivas populações, com um
previsível efeito de dominó em todo o mundo.
Pelo
que nos cabe a nós, Portugueses, privilegiados que somos em tantos aspectos, uma
bem pequena obrigação, aquela que vivemos desde o início da pandemia: fiquemos
em nossas casas!
Sem comentários:
Enviar um comentário