À PROCURA DAS PALAVRAS PERDIDAS
Carlos Rodarte Veloso
“O Templário”, 15 de Outubro de 2020
Em nenhuma época
da História se escreveu tanto sobre seja o que for, e a quantidade de texto
produzido, como naturalmente teria que acontecer, pelo seu volume crescente, não
se compadece com a natureza equilibrada que devia presidir à sua redacção.
Porque quantidade
e qualidade nunca se deram bem, e hoje toda a gente escreve, sentindo-se
democraticamente autorizada pelo veículo de excelência da difusão de ideias, as
redes sociais, que aceitam todas as agressões, gramaticais ou ideológicas com a
natural complacência das antigas ardósias escolares, as quais tinham pelo menos
a virtude de ao serem apagadas, logo caírem num misericordioso esquecimento.
Como se fosse
pouca a difusão electrónica das opiniões de todos os que julgam saber escrever,
muitos desses textos apoderam-se do qualificativo de “literatura” e são
impressos aos milhões, alimentados pela vaidade dos autores, o acriticismo dos
“especialistas” – muito menos especializados do que se julgam, ou os julgam, e
ainda menos competentes – e, muitas vezes, o cálculo dos grupos de pressão
ideológica movidos pela política de baixo escrúpulo de que o populismo hoje
invasor, é o pior exemplo.
É que não basta
aplicar as regras gramaticais para se escrever correctamente, e essas,
coitadas, já vão bem longe das aspirações de 90% dos escrevinhadores, para mais
confrontados com um “Acordo ortográfico” incompreensível, metodológica e
esteticamente.
Por isso
recuso-me a segui-lo, lamentando tal aberração, até pelo facto de ter sido
promovido por personalidades com grandes responsabilidades na Cultura
portuguesa e que ainda consigo respeitar, apesar da gigantesca dúvida que agora
me suscitam pela sua submissão a modas e políticas que acabam por corromper a
nossa bela Língua.
Mas adiante, no
emaranhado da comunicação outras formas de escrever se vão impondo,
conquistando principalmente uma juventude com escassa formação linguística que,
em alucinantes mensagens de telemóvel vão impondo novas modas no falar e no
escrever.
Parece que há
aqui uma “urgência” de nada dizer excepto os lugares-comuns que a preguiça e a
ignorância incentivam.
Claro que esta
prática não nasceu em Portugal, mas nos poderosos Estados Unidos, difundindo-se
por todo o planeta sob formas o mais básicas possível, que vão retirando às
diversas línguas a sua originalidade, a beleza e a pureza das coisas simples,
amadurecidas pela prática social e enriquecidas pelas aquisições que o
conhecimento faculta.
As contradições
nascidas deste desenvolvimento pouco harmónico das formas de falar e escrever,
conduzem a meu ver, ao empobrecimento do próprio pensamento racional, desde
sempre a reboque da sua expressão material, sendo esta a principal consequência
daquele.
O desenvolvimento
das nossas competências racionais não pode ficar à margem do uso das palavras,
estas cada vez mais desvalorizadas – telegraficamente desvalorizadas! – mesmo
no uso mais nobre da palavra escrita e falada, a Literatura.
Palavras, leva-as
o vento, dizem… mas há palavras e palavras, muitas delas tesouros em vias de
extinção. Preservemo-las enquanto é tempo!
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