quarta-feira, 31 de janeiro de 2018


OS "POPULARES" EUROPEUS E O SEU OPORTUNISMO ABJECTO PARA COM CENTENO E PORTUGAL

Parece que da parte de certa "gente" tudo é possível. Custa a crer que dois bilhetes para um jogo de futebol possam dar aso a uma tal dose de diarreia menta! O oportunismo e estupidez andam de braço dado nesta iniciativa dos "populares" europeus, certamente incentivados pela desonestidade intelectual a que a Dona Cristas já nos habituou, um autêntico comprovativo do que de mais baixo se tem feito na "política" de retrete desta direita tacanha e acéfala.

quinta-feira, 18 de janeiro de 2018


ARTE E ICONOGRAFIA

Carlos Rodarte Veloso

“O Templário”, 18 de Janeiro de 2018



As artes figurativas, isto é, a pintura, a escultura e as artes aplicadas, exigem dos seus estudiosos – historiadores da arte e das mentalidades, conservadores e restauradores do património, e todos os profissionais que de alguma forma lidam com objectos artísticos – a observação e identificação dos temas representados através de duas disciplinas auxiliares, a Iconografia e a Iconologia, desde as suas origens renascentistas muitas vezes confundidas uma com a outra.
No entanto, o grande historiador da Arte que foi Erwin Panofsky, distinguiu-as na sua obra “Estudos de Iconologia”, publicada em 1939. Para ele, Iconografia era a descrição mais imediata do assunto representado numa obra de arte, enquanto a Iconologia aprofundava o seu significado.
Panofsky exemplificava com o acto de “tirar o chapéu”, costume masculino hoje já caído em desuso. Num primeiro momento, (Iconografia), o homem descobre a cabeça, retirando o chapéu. Num segundo momento (Iconologia), identifica-se tal hábito como um acto de cortesia, “resquício do cavalheirismo medieval: os homens armados costumavam retirar os elmos para deixarem claras as suas intenções pacíficas“.
Sendo assim, é fundamental o conhecimento dos costumes quotidianos e o estado das mentalidades nas diversas épocas, mormente naquela a que pertence o universo do artista em causa, para se compreender as representações simbólicas que produziu.
No livro citado, Panofsky explicita as suas ideias sobre os três níveis da compreensão da obra de arte:
“Primário, aparente ou natural: o nível mais básico de entendimento, que consiste na percepção da obra na sua forma pura. Tomando-se, por exemplo, a pintura da Última Ceia de Leonardo da Vinci, no primeiro nível o quadro poderia ser percebido somente como uma pintura de treze homens sentados à mesa. Este primeiro nível é o mais básico para o entendimento da obra, despojado de qualquer conhecimento ou contexto cultural.
Secundário ou convencional: Este nível avança um degrau e traduz a equação cultural e o conhecimento iconográfico. Por exemplo, um observador do Ocidente entenderia que a pintura dos treze homens sentados à mesa representaria a “Última Ceia de Cristo com os Apóstolos”.
Significado Intrínseco ou conteúdo (Iconologia): este nível leva em conta a história pessoal, técnica e cultural para entender uma obra de arte. Parece que a arte não é um incidente isolado, mas um produto de um ambiente histórico.”
Por que motivo teria então Leonardo da Vinci pintado na extensa parede frontal do refeitório do Convento de Santa Maria delle Grazie, em Milão, em tamanho natural, as treze personagens evangélicas que, em vez de revelarem Judas como o apóstolo traidor – como era típico até então – manifestam magistralmente a dúvida que corrói a assembleia, o clima de suspeita que se instala, decerto bastante semelhante àquele que imperava nas várias cortes das cidades-estados italianas, nomeadamente na de Ludovico Sforza, mecenas e protector de Leonardo? De facto, os homicídios políticos por envenenamento eram então comuns na Itália das repúblicas e dos principados, especialmente em banquetes. Por outro lado, a presença quase carnal dos doze apóstolos e de Cristo em face dos monges reunidos numa refeição, dramatiza especialmente este momento fundador do sacramento mais sagrado da Igreja católica, a Eucaristia.
A Iconografia e a Iconologia não se limitam à descrição e interpretação das imagens históricas ou simplesmente míticas, mas estudam também três categorias especiais de representação, que auxiliam a sua identificação e interpretação: as Alegorias, os Símbolos e os Atributos.
As Alegorias, representações que materializam ideias abstractas, como a Ira, a Bondade, a Guerra, o Ciúme e tantas outras, sempre assumindo a forma de homens ou mulheres consoante o género da abstracção: a Virtude como mulher, o Patriotismo como homem.
Os Símbolos, que são insígnias, emblemas e outros sinais convencionais relacionados com a respectiva ideia. A Estrela de David, a Cruz de Cristo, o Crescente muçulmano, a Esfera Armilar, a Coroa imperial...
Os Atributos, muito associados aos elementos anteriores, elementos gráficos que caracterizam figuras históricas ou lendárias, sacras ou profanas, caso de Jesus menino ao colo da Madonna, das setas cravadas na corpo nu de S. Sebastião ou a coroa de louros e a venda no olho cego de Camões.
Ferramentas essenciais no estudo e divulgação das obras de arte, a Iconografia e a Iconologia vêm-se tornando cada vez mais presentes nos curricula dos estudos artísticos.



sexta-feira, 12 de janeiro de 2018


O MAR MORTO NUMA CRATERA VULCÂNICA
Carlos Rodarte Veloso
"Correio Transmontano", 12-1-2018 
Em Novembro de 2001 tive a oportunidade de conhecer a ilha do Sal do arquipélago de Cabo Verde, a mais árida de todas, desmentindo assim a sua designação colectiva, ao mesmo tempo que confirma pela aridez o seu nome singular.
De facto, o nome é tão salgado como o salque abunda no mar em torno e, principalmente, nas famosas salinas nascidas na cratera de um vulcão hoje extinto, por infiltração das águas do mar e sua consequente e parcial evaporação. A cratera e salinas, denominadas “Pedra de Lume”, reflectem a luz de um sol impiedoso e reverberam nos cristais de cloreto de sódio as cores dos seus sais constituintes, num espectro que vai do vermelho e rosa ao azul e amarelo, marginando pequenos canais onde os visitantes têm a raríssima oportunidade de recriar as sensações do mergulho nas densíssimas águas palestinianas do Mar Morto, visto aqui como lá não ser necessário dominar as técnicas da natação para flutuar, a bem ou a mal...
Dada a falta de água doce em toda a ilha, só a partir de 1833 começou a ser explorada a sua riqueza em sal, exactamente em Pedra de Lume, dando assim início ao povoamento, tendo as salinas sido exploradas industrialmente até meados dos anos 80. Depois disso assistimos ao abandono desses equipamentos industriais, agora espalhados em ruínas no interior da cratera, dando ao local uma visão de “cidade fantasma”. Tanto quanto me apercebi, a economia da localidade vive hoje parcialmente do comércio dos grossos cristais de sal das mais diversas cores, vendidos aos turistas, e da venda de bilhetes de visita à cratera aos mesmos turistas.

 A outra fonte de riqueza, a pesca, é de carácter artesanal, como aliás noutras localidades da ilha, especialmente valorizada pelo aeroporto “Amílcar Cabral”, na vila de Espargos, onde um grande mercado comercializa os produtos locais.
Também viveiros de lagostas contribuem para alguma melhoria das condições económicas do Sal, assim como a construção na vila de Santa Maria, de numerosas unidades hoteleiras de qualidade exploradas maioritariamente por estrangeiros, obviamente fora das possibilidades económicas dos cabo-verdianos, que as frequentam com o seu trabalho, como empregados de manutenção, limpeza e restauração e, na melhor das hipóteses, guias turísticos e comerciantes de recordações. 


Para suprir a falta de água doce, uma unidade de desalinização da água do mar foi construída.
É claro que estamos perante um turismo de mar, praia e desportos náuticos, que se desenrolam numa paisagem marítima deslumbrante. Mais dependente do que o restante arquipélago das contraditórias benesses do turismo, a ilha do Sal é um exemplo notável da capacidade de sobrevivência e da inteligência de um jovem povo contra todas as dificuldades de uma natureza difícil.

quinta-feira, 11 de janeiro de 2018



ARTE E LITERATURA

Carlos Rodarte Veloso

“O Templário”, 11 de Janeiro de 2018

As tradições orais abrangendo a história real ou imaginária das comunidades humanas ao longo dos séculos, contribuíram para a sua coesão e justificação num mundo repleto de dificuldades e perigos de toda a ordem, muitos deles advindos de comunidades rivais. No entanto, a transmissão oral de geração em geração caracteriza-se pela progressiva alteração da mensagem original, perdendo-se informação ou acrescentando-se-lhe novos dados que acabam por confundir história e lenda. Como diz o povo, “conta-se um conto, acrescenta-se um ponto”.
As figuras reais dos fundadores depressa se convertem em deuses ou heróis dotados de transcendentes poderes, eles próprios míticos criadores dessas comunidades. Só a fixação desse acervo de informação através da escrita, isto é, da Literatura, permitiu fixar essa torrente desenfreada de informação, tantas vezes incoerente e contraditória.
Antes da invenção da Escrita, ainda em plena pré-história, era a representação gráfica desses mitos de fundação, por exemplo através da Arte rupestre, que consolidavam a informação, mesmo falseada, acerca dos diversos povos.
Com a invenção da Escrita torna-se possível guardar na memória – pois de memória estamos a falar – desde os factos corriqueiros do dia a dia relacionados com a economia, a sucessão das dinastias de sacerdotes e reis, verdadeiros ou míticos, as batalhas, os desastres naturais e os pensamentos mais íntimos dos seus autores.
Inscrita na pedra, em placas de argila, em papiro ou noutro qualquer suporte, assim nasce a Literatura nas suas múltiplas vertentes, da histórica à lendária, em verso ou em prosa, sendo o ritmo poético um vestígio da sua origem oral, quando os aedos dele se serviam para memorizar um texto geralmente demasiado longo para reter.
A mais antiga Literatura é baseada no Mito, nos factos imaginários associados à criação do Universo, às origens dos deuses e da humanidade, às suas estratégias de sobrevivência e às suas relações mútuas confundindo, num todo caótico, História e Religião. A esse caos fabuloso chamou-se Mitologia, a primeira das narrativas literárias.
Assim como a primeira arte da humanidade, a arte pré-histórica, nasce da observação directa da natureza e da narrativa oral, a narrativa escrita vai inspirar uma arte crescentemente complexa e ambiciosa, que vai ter o seu apogeu com o Romantismo, já no século XIX, sem esquecer a importância das artes desde a Antiguidade ao chamado Antigo Regime que precede a Revolução Francesa.
Sendo manifestamente impossível desbravar num só artigo um tão vasto terreno, limitar-me-ei a referir alguns artistas oitocentistas e  novecentistas cuja obra ilustrou alguns dos mais populares temas da Literatura universal. Assim seleccionei cenas de algumas das obras imortais de Homero, Dante Alighieri, Camões, Shakespeare e Cervantes, pintadas por artistas que revelaram especial vocação para essa temática.
O mais antigo e enigmático é Homero, designação do autor – ou autores – dos  poemas épicos fundadores da Literatura europeia, “A Ilíada” e “A Odisseia”, escritos ou passados a escrito entre os séculos IX e VIII a.C., cuja temática gira em torno da Guerra entre Gregos e Troianos, dos seus heróis e deuses, e das aventuras fabulosas do lendário rei de Ítaca, Ulisses, o herói “fértil em recursos”, cuja périplo de dez anos entre o Mar Egeu e o Mar Jónio constitui talvez a primeira narrativa de aventuras da história literária ocidental. Muitos artistas, desde os anónimos pintores de vasos da Grécia Clássica, aos artistas pré-rafaelitas da Inglaterra vitoriana, se ocuparam desta história imortal, recuperando-a também para o Cinema, a 7ª Arte, onde conheceu êxitos extraordinários. Como exemplo da arte pré-rafaelita, apresento a pintura de Waterhouse representando o episódio de “A Odisseia”, Ulisses e as Sereias (fig.1) pintada em 1891.


Segue-se o poeta e político florentino Dante Alighieri (séc. XIII-XIV),  considerado o primeiro e maior poeta da língua italiana e intitulado o sumo poeta", sendo ele próprio o criador do Italiano moderno. As suas aventuras visitando os três reinos dos mortos, o Inferno, o Purgatório e o Paraíso, nos dois primeiros acompanhado pelo poeta romano Virgílio, no terceiro pela sua própria e defunta noiva, Beatriz, são relatadas na “Divina Comédia”. Tema romântico por excelência, encontramo-lo no dramático quadro do pintor francês Delacroix, A Barca de Dante, pintado em 1822 (fig.2). A bordo da barca de Caronte, o barqueiro do Inferno, Dante e Virgílio são assediados pelas almas insepultas que procuram subir para bordo.


O nosso Camões não poderia ficar de fora desta mini-antologia de obras imortais, neste caso representado pelo famoso episódio do Canto IX de “Os Lusíadas”, tema fortemente pagão que chegou a ser proibido no programa oficial dos Liceus da época salazarista dado o seu carácter vincadamente sensual. Trata-se do tema A Ilha dos Amores, quando os heróicos navegadores portugueses obtém a recompensa dos perigos experimentados na primeira viagem à Índia, nas carícias das belíssimas Ninfas enviadas por Vénus. José Malhoa, grande pintor naturalista português passou-o à tela c. 1908 (fig.3).


Shakespeare, para muitos o maior escritor da História da Literatura, foi abundantemente revisitado por artistas pré-rafaelitas como Arthur Hugues, no caso presente através de um tema da peça “Hamlet” (1599 – 1601), Ofélia, a bela noiva do Príncipe da Dinamarca, deambulando pelos bosques (fig.4) pintado em 1865.


Finalmente, o grande escritor espanhol Cervantes e a sua obra-prima, “ O Engenhoso Fidalgo D. Quixote de La Mancha”, publicada em 1605. Esta narrativa trágico-cómica põe em confronto os altíssimos ideais de Cavalaria da Idade-Média e o espírito mercantilista da época do Escritor, através da viagem por Espanha de um fidalgote obcecado pela gesta desses heróis românticos, acompanhado pelo seu fiel escudeiro Sancho Pança, este personificando o materialismo e o oportunismo do Século de Ouro de Espanha. Excelente ilustração disto mesmo é a obra do espanhol Picasso, de 1955, representando D. Quixote, Sancho Pança e os Moinhos (fig.5), que ele via como gigantes ameaçadores.


Em todos estes autores, a superação dos limites humanos através do heroísmo, da inteligência e da honradez.