quinta-feira, 13 de dezembro de 2018



HIC ET NUNC

Carlos Rodarte Veloso

“O Templário”, 13 Dezembro de 2018

São cada vez mais confusos os tempos que vivemos.
Enquanto uma feliz e inesperada conjunção de esforços criou em Portugal uma união política que colocou no poder um partido de Esquerda, apoiado – mesmo com algumas reservas – por outras forças de Esquerda, aliás mais radicais, mas que souberam negociar essas reservas em prol de um bem maior, esta solução democrática, original no nosso país mas perfeitamente corrente em diversos parceiros europeus, foi desde o início atacada pela Direita, que mimoseou esta solução com o nome de “Geringonça”.
Terminado o terceiro ano do mandato, recuperado um número considerável dos direitos que o anterior governo de Direita tinha aniquilado e perante uma recuperação económica verdadeiramente notável e reconhecida pelos nossos pares da União Europeia, asim como por outros países amigos, logo se instala a ideia de que é o momento de partir para a correcção total dos abusos desse periodo negro da nossa História recente, exigindo-se “hic et nunc” (“aqui e agora”) a recuperação de TODOS os direitos coartados às classes trabalhadoras, tanto em termos de condições de trabalho, como de vencimentos.
Revivendo um pouco os longínquos tempos do PREC, eis que todas as forças produtivas se levantam agora em pé de guerra, exigindo de imediato aquilo que, nem nos tempos do governo de Passos Coelho era reivindicado.
Essas exigências, evidentemente justas mas dificilmente exequíveis, dado o gigantismo das verbas em causa e o facto de as nossas dívidas, mesmo no bom caminho, estarem ainda muito longe de estar sanadas, são reivindicadas, não apenas por alguns dos grupos sociais mais débeis economicamente, aqueles cuja mais elementar justiça social indicaria como preferenciais na reposição dos direitos mas, inesperadamente, por grupos, ou francamente abonados, ou relativamente remediados e que foram totalmente inertes politicamente durante o consulado de Passos Coelho.
Refiro-me, evidentemente, a dois grupos especialmente agressivos e cujo estatuto profissional me parece exigir grande contenção, dado o serviço público que exercem e a deontologia que se lhes exige: os juízes, que ao serem parte dos órgãos de soberania não deveriam, na minha óptica, beneficiar do direito à greve, e os profissionais da Saúde, médicos e enfermeiros, estes menos beneficiados, mas para quem esse direito deveria ser utilizado de forma especialmente circunspecta, já que da sua paralização podem resultar – e sem dúvida resultam – graves inconvenientes para as classes trabalhadoras que dependem inteiramente do Serviço Nacional de Saúde, inconvenientes que se podem saldar, até, na morte ou no prejuízo permanente da sua saúde.
Poderá argumentar-se que são os enfermeiros os profissionais que, de forma mais radical se têm mantido num estado de greve quase permanente e que, chocantemente, se gabam através dos seus sindicatos e, espantosamente, da sua Bastonária, pessoa com ligações partidárias bem conhecidas ao PSD, do “êxito” dessas greves quase contínuas que já levaram ao adiamento de milhares de intervenções cirúrgicas por todo o país.
E é exactamente esta estranha bastonária que informa agora o primeiro-ministro de que Portugal está perante “uma catástrofe e uma calamidade sem precedentes” com cinco mil cirurgias adiadas… Fez a festa, e deita os foguetes!


Isto não é uma greve. É um atentado criminoso à saúde dos portugueses mais desfavorecidos! Dêem o nome aos bois! A situação parece-me de tal forma grave, que justifica plenamente a requisição civil e com a máxima urgência!

Entretanto, os ventos de revolta que nos chegam de França começam a contagiar as nossas redes sociais, não tão sociais assim porque começam a imitar, não a indignação perfeitamente justa dos “gilets jaunes”, mas a prática violenta dos adventícios, leia-se, provocadores que se lhes misturaram e com eles se confundem, convocando à destruição gratuita… Uma dessas redes  convida “a incendiar Portugal”, coisa de que estamos sem dúvida necessitadíssimos como já se comprovou com os incêndios de triste memória que enlutaram o país!...


Há assim um estado de quase histeria por parte de muitos dos utentes das nossas redes sociais incitando à revolta pela revolta o que conduziria  a nada  mais do que a destruição e, provavelmente, ao jogo dum niilismo inconsequente. Em suma, com Marine Le Pen à espreita e o populismo a subir, já adivinhamos os "abençoados" tempos da maré fascista... E convidam-me a partilhar!
Se um número razoável de franceses apoiantes de Marine Le Pen, oportunisticamente se infiltraram no movimento original da Esquerda, com a intenção clara de o destruir, temos que os imitar? O nosso principal problema é defender a unidade da nossa Esquerda para recuperar o muito que perdemos em direitos com o anterior governo. E aproveitar o que de bom tem sido feito! Não podemos alinhar em provocações, na estupidez do "aqui e agora"!

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