REDES MUITO POUCO SOCIAIS
Carlos Rodarte Veloso
“Templário”, 19 de Dezembro de 2019
Desde
que as chamadas redes sociais conquistaram a Internet, subiu em flecha a
expectativa de que a abertura desse gigantesco fórum da opinião viria a unir as
pessoas de todos os continentes e, assim, garantir um diálogo democrático a
nível global, eliminando de vez a prepotência de todas as ditaduras.
Ingenuidade
pura! A invasão da Internet não só foi rapidamente apropriada pelos poderes
autocráticos que, onde estavam estabelecidos, sabiamente limitaram os seus
poderes mediáticos através de formas mais ou menos habilidosas de censura e
vigilância das opiniões “contra”, como se serviram da exposição a que se
sujeitaram voluntária e gostosamente os seus actores, para interferir,
anonimamente por vezes, mas também com o crescente “contributo” de muito
público e dos próprios media, para intervir politicamente, não de acordo com as
maiorias que teoricamente controlariam a opinião, mas frequentemente contra
essas mesmas maiorias.
O
semianonimato que os mecanismos da Net permitem, introduziram aos milhões – e o
número cresce diariamente! – anónimos manipuladores cujo papel político se
sobrepõe à lógica das maiorias reais, que já não há já forma de avaliar.
É
assim fácil, mesmo nos países mais democráticos, que ideias que num diálogo
aberto e face a face, dificilmente encontrariam apoiantes na sociedade no seu
conjunto, são sentidas como tendencialmente maioritárias.
São
assim fáceis as generalizações, quer para atacar determinado status quo, quer
para promover outro, porventura abominável em termos históricos – caso do
nazi-fascismo e das diversas formas de totalitarismo – ficando a população
usuária completamente desinformada da ordem de grandeza da adesão a essa
tendência.
Essa
manipulação é agora um facto bem conhecido, apesar da extraordinária
dificuldade em denunciá-la factualmente, como tem acontecido com a sua
interferência nos actos eleitorais de um número crescente de países – ainda –
democráticos, como os Estados Unidos, o Reino Unido, a Espanha, o Brasil…
É
evidente a interferência do grande capital internacional nesta manipulação,
capaz de deturpar a própria autoridade da Ciência no que toca, muito
especialmente, às alterações climáticas, cuja evidência continua a ser negada
pelas “autoridades” políticas e religiosas de um número inacreditável de
países.
Por
outro lado e não desprezivelmente, os próprios utentes a nível individual –
falo das pessoas singulares e não ligadas necessariamente a lobbies – servem-se
deste mecanismo para se libertarem da opressão social, inevitável nas relações
humanas, mas também face ao poder instituído, muitas vezes corrupto mas na
maioria das vezes inevitavelmente errado nas suas opções, a mais das vezes
devido às naturais limitações materiais, mais sentidas nos países mais pobres,
mas também nos mais poderosos.
Não
são assim apenas manipulados os dados reconhecidos sobre as opiniões dominantes,
mas as próprias opiniões acabam por ser modificadas, muitas vezes radicalmente,
dando origem a autênticas inversões de tendências tidas até então como a norma.
A
toda esta triste situação se acrescenta a contaminação das relações
interpessoais, o recurso crescente ao insulto, a exposição da intimidade da
família assim prejudicando a sua própria segurança, a abertura ao discurso do
ódio, da inveja e da maledicência…
Por
vezes tenho sido tentado a abandonar de vez o Facebook, a rede “social” que
ainda acompanho, e só não o faço porque procuro, fugindo evidentemente a esses
aspectos mais do que negativos, nojentos, dar um contributo quanto possível
isento para transformar este mecanismo de comunicação que tantas esperanças
suscitou nos seus começos, numa esperança para o diálogo entre todos os seres
humanos.
Com
cada vez menos esperança, devo dizer!
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