terça-feira, 5 de maio de 2020



APRESENTAÇÃO DE UM PAÍS
Carlos Rodarte Veloso
“O Templário”, 30 de Abril de 2020

Gravura de João Abel Manta

Desde o período da ocupação filipina, Portugal teve o “fado” de se ter tornado quase invisível no panorama histórico mundial, frequentemente confundido com a Espanha à qual concedia o seu enorme peso colonial para a engrandecer.
Era de facto o tempo do “Império onde o sol nunca se punha”, título depois da Restauração herdado pelo Império Britânico.
Da nossa História, apenas sobravam imagens espectrais duma época nebulosa de marinheiros e navegadores, descobridores, sim, mas “pés descalços”, pouco enaltecidos face à prosápia espanhola da descoberta da América e de outros feitos marítimos e militares, a que não faltava, pasme-se, o fracasso monumental de uma dita “Invencível Armada”!
Nem o domínio da Índia, a colonização brasileira e a precoce chegada à China e ao Japão foram suficientes para plasmar com verdadeiro sucesso a aventura portuguesa nas páginas da historiografia europeia.
O peso monumental da Espanha sempre se sobrepunha a nós, pequena nação, dominada depois pela concorrência neerlandesa e pelos traiçoeiros aliados ingleses, sempre atrasada, sempre retrógrada, vitimada pela superstição católica romana que, embora comum ao atraso espanhol não se alicerçava sobre um poder das armas ou prestígio internacional, para não falar do seu défice de influência religiosa junto da Santa Sé.
Tal como a Espanha tivemos a Inquisição, e momentos de grande prestígio internacional, mas com pouca continuidade, caso do reinado de D. João V, embora a reboque do ouro do Brasil, e do fugaz episódio pombalino, depressa submerso nas grandes invasões francesas e na guerra civil entre liberais e absolutistas, num século de altos e baixos dominados pela predominância económica britânica e uma apenas relativa “revolução industrial”…
O século XX, dilacerado pela Grande Guerra para a qual foi arrastada a nossa jovem República em prol da defesa do domínio colonial africano, logo seguido do gigantesco desastre humanitário da pandemia da “gripe espanhola”, ainda deu tempo para algumas importantes reformas educativas, mas marcadas pela instabilidade social e política do País, que conduziu ao golpe de Estado de 28 de Maio de 1926 e à edificação do chamado Estado Novo e do regime ditatorial de Salazar, época de férrea repressão policial, à imagem e semelhança das ditaduras nacionalistas europeias, cópia próxima dos fascismos italiano, germânico e espanhol.
Foi nesse quadro de ditadura nacional, que muito desprestigiou o País, que teve início a guerra colonial, a que apenas o 25 de Abril de 1974 pôs fim, com Portugal mobilizado colectivamente, em torno de umas Forças Armadas inesperadamente democratizadas, cujo vitorioso golpe de Estado acaba por dar origem a uma verdadeira Revolução popular.
É exactamente a edificação do regime democrático nascido em 25 de Abril mas alimentado desde a época mais repressiva da ditadura pela revolta popular dos mais diversos sectores da vida social e política, que confere ao nosso País uma imagem de modernidade e de desenvolvimento completamente nova, a que não é alheia – apesar das controvérsias a que deu aso – a adesão ao Mercado Comum Europeu e à União Europeia.
A nossa Revolução – não tenhamos medo dos nomes, pois de uma Revolução se trata – abriu aos olhos de uma Europa fortemente lusocéptica, este pequeno País em que vivemos, tornado um “caso de estudo”, tanto pelo muito que se desenvolveu no aspecto científico e tecnológico, político, artístico, literário e, até, desportivo, como pelo prestígio de muitos dos seus dirigentes que, embora de contraditórias tendências políticas, marcaram fortemente as suas áreas de influência, mesmo nos maiores areópagos internacionais.
As críticas com que, desde sempre, a nossa democracia tem sido mimoseada, nomeadamente pelos sectores politicamente mais adversos às tendências dominantes, são mais uma prova da vitalidade de um regime que nem uma pandemia como a que agora nos vitima, impede o pluralismo, verdadeiro apanágio da Democracia.



Sem comentários:

Enviar um comentário