segunda-feira, 29 de setembro de 2014

O Templário, 11-9-2014
 
O Banco Bom e o Banco Mau
Não pretendo ironizar sobre as possíveis semelhanças entre os herdeiros do Espírito Santo – e aqui está outra interessante, embora blasfema, oportunidade de ironizar – e o polícia bom e o polícia mau  das técnicas de interrogatório que, diz-se, fazem parte da prática policial. Por isso não estabelecerei um tentador paralelismo entre a situação dos utentes do banco, vítimas apenas da sua ingenuidade, e a dos seus dirigentes, gente decerto irrepreensível e duma honestidade a toda a prova.
Foi decerto essa reconhecida honestidade que levou o mais alto magistrado da nação a convidar o povo português a confiar na instituição e a investir nela as suas poupanças, mesmo quando já soavam discretamente as sereias de alarme da bancarrota eminente. Os cidadãos que entenderam seguir esse conselho, só por má fé o podem agora acusar desse erro, que só poderá ser equiparado ao seu erro, ainda maior, de o elegerem.
O alto magistrado já nos habituou à sua finíssima intervenção nos momentos críticos da nossa história recente, assim comprovando as suas certezas absolutas em que, dizia ele, raramente se enganava. E já o demonstrava na sua anterior condição de primeiro ministro, quando legislava o fim de actividades marítimas tradicionais como a pesca e a marinha mercante que, agora como Presidente da República, considera essenciais à nossa sobrevivência como Estado.
Tanta coerência quase nos faz esquecer o despesismo de que o seu magistério é acusado, decerto injustamente, visto que bem conhecemos as suas aflitivas queixas quanto às dificuldades domésticas que os seus parcos rendimentos lhe fazem sentir. Nem podemos pôr em causa o seu patriotismo quando em 2010, viu Portugal ser enxovalhado publicamenente pelo presidente da República Checa, sem ter aberto a boca para defender o nosso país. Na verdade a sua cuidada educação, o seu cavalheirismo, não permitiriam uma miserável peixeirada num local público, ainda por cima internacional. Assim é Portugal, terra de honra, mas também de educação. Ainda hoje a sua atitude de firme silêncio, deixa envergonhado todo o povo checo.
Voltando ao agora falecido Banco Espírito Santo, assisto emocionado à originalíssima estratégia dos nosso governantes, a dividirem o mal pelas aldeias: de um lado, o Banco Bom, aquele que vai render mais uns milhões para o Estado arrecadar no tal cofre sem fundo que sempre tem disponível para os outros bancos, bons e maus, a que se juntará alguma coisinha dos contribuintes, no caso de qualquer das habituais derrapagens. E o Mau, enfim, vai para o inferno dos paraísos fiscais... Esta frase até tem a sua piada.

Carlos Rodarte Veloso

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