segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018


INSTALAÇÃO "PRESOS POLÍTICOS" DE SANTIAGO SIERRA CENSURADA NA FEIRA DA ARTE ARCOMADRID 2018

Carlos Rodarte Veloso 
26 de Fevereiro de 2018


A parede da exposição antes e depois do acto de censura.

As 24 fotografias pixelizadas de PRESOS POLÍTICOS EM ESPANHA, onde se incluíam os líderes independentistas catalães presos, acusados de "rebelião e secessão", foram retiradas por decisão da galerista Helga de Alvear a pedido do presidente da IFEMA, González Soler que, muito estranhamente, não reconhece este acto como censura, embora depois o lamente e disso apresenta desculpas!
Desculpas esfarrapadas que já nada remedeiam, antes acendem os seus holofotes sobre a gravíssima tendência fascizante das autoridades espanholas que não apenas prosseguem velhos hábitos dignos da ditadura franquista, reprimindo qualquer tendência autonomista séria, mas também reprimindo cinicamente toda a liberdade de expressão sobre esse tema.
O tema "presos políticos" em Espanha é portanto tabu, mas também a mais pura das verdades, por muito que custe às virgens ofendidas que querem tapar o sol com uma peneira e manter uma aparência democrática.
Alinha assim o nosso "democrático" vizinho com as tendências autoritárias manifestadas pelos governos de de vários países europeus, mas indignas deste continente que queríamos, fosse um exemplo para o Mundo. Assim, passo a passo, se criam as sinistras condições que antecederam a II Guerra Mundial.
Ou já estará a travar-se a Terceira, como denuncia o papa Francisco?

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2018


A "SUGESTÃO" DE TRUMP PARA ARMAR OS PROFESSORES 
Carlos Rodarte Veloso



Não há limites para a estupidez e a corrupção deste indivíduo: podemos imaginar os lucros que ele está a oferecer à associação norte-americana das armas de fogo ao obrigar todos os professores a comprar uma arma e, por certo, a contratarem lições de auto-defesa e... sei lá o que mais! E o perigo que representa a entrada neste mercado de cowboys de mais um largos milhares de armas. As salas de aulas podem facilmente tornar-se em saloons de western, e os mortos contarem-se por milhares... Por que não armar também os contínuos, os alunos e os seus encarregados de educação? No fim, matavam-se todos uns aos outros...
O que vale é que não acredito que ele consiga impor esta "lei" da selva. Se o conseguisse, e espero bem que não, dada a corajosa reacção dos professores que o enfrentaram nos media, seria bom que um cataclismo bíblico o afundasse e à Casa Branca e a quantos o apoiassem!

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018



AS CAPELAS DE OSSOS EM PORTUGAL E A ARTE DO MACABRO

Carlos Rodarte Veloso

“O Templário”, 22 de Fevereiro de 2018


                As “capelas de ossos”, espaços sacros revestidos de ossos humanos, organizados em camadas alternadas de caveiras, tíbias e fémures, em arranjos horizontais e verticais, leia-se, artísticos, representam uma das mais macabras mas também originais manifestações de piedade, correspondendo à preparação monacal para uma “boa morte”.
Essa preparação está especialmente associada a capelas de conventos, destinadas expressamente à  contemplação dos ossos”, símbolo da transitoriedade das coisas terrenas, convite à oração pelas Almas do Purgatório e à reflexão sobre a hora mortis e a necessidade de desprezar as “coisas vãs” do mundo, as quais conduziriam inevitavelmente à perdição das almas.
                Pode não parecer á primeira vista muito convencional  promover a obra de arte as “capelas de ossos”. Mas a obra de arte consiste em “modificações intencionais que o espírito humano imprime em objectos da natureza”, como refere Raymond Bayer. Assim e ao contrário do que se passa com a paisagem natural propriamente dita, a disposição artificial dos mesmos elementos naturais formando, por exemplo, um dólmen ou um cromeleque neolíticos ou, no século XX, as composições da “land art”, já não suscita grandes dúvidas sobre a sua natureza artística. É isso exactamente que se passa em todos os monumentos cujo material de base são os últimos dos despojos humanos, os ossos. Dos mais simples “carneiros”  — os ossários medievais — às capelas de ossos  propriamente ditas, todo o cenário  assim organizado  tem um propósito implícito e uma organização que nada tem de natural.
                Falei em cenário, e essa referência remete-nos para o universo das atitudes humanas perante a morte e das mentalidades que as geraram: o teatro, o espectáculo, prenúncio do Barroco, já presente no riso sinistro da caveira do “carpe diem” romano, ou dos túmulos de diferentes épocas, na “dança macabra” medieval, ou nos repugnantes jacentes dos séculos XIV e XV, representando, em todo o seu horror, a decomposição do cadáver, símbolo acabado da impureza que a morte traz…
                E a oração pelas Almas do Purgatório logo recorda a problemática  da invenção do Purgatório, por volta do século XI, depois dos primeiros séculos do Cristianismo marcados a fogo pelo dualismo Paraíso-Inferno, tema caro ao historiador Jacques Le Goff e cuja importância foi tão expressivamente vincada por Pierre Chaunu. Logo me ocorre ainda a espontaneidade e o vigor do culto popular das “Alminhas”  e de todas as Confrarias que lhes prestaram culto no nosso País, sendo evidente a sua relação com as capelas de ossos.
                É num contexto pré-barroco que são construídas as primeiras capelas de ossos em Portugal, havendo também pelo menos um exemplo espanhol, a capela de ossos de Wamba, próximo de Valladolid, pelo menos duas em Itália e outras em diversos países da Europa Central, e também uma em Lima, no Peru. É provável a existência de muitas outras, espalhadas pelo mundo.
                Quanto ao levantamento destas capelas em Portugal, parecem bastante promissores os resultados obtidos. De momento, podemos referir, globalmente, as seguintes capelas portuguesas: a de Santa Cruz de Coimbra, quinhentista, e  as de Elvas, desaparecidas, a da Igreja de S. Francisco, no Porto, a de S. Francisco de Évora, a mais célebre, as de Campo Maior, Monforte, Lagos,Alcantarilha (Silves), Pechão (Olhão) e as duas de Faro. São, assim, doze ao todo, apenas duas delas situadas a norte do Tejo.

Fig. 1 – Entrada na Capela de Ossos da Igreja de S. Francisco, Évora

Fig. 2 – Capela de Ossos da Igreja de S. Francisco, Évora

Fig. 3 – Capela de Ossos de Campo Maior

Fig. 4 – Capela de Ossos da Igreja do Carmo, Faro   

Há que acentuar que a do Porto é menos uma “capela de ossos” do que um ossário, correspondente aos antigos “carneiros” medievais, visto consistir em aglomerados de crânios e ossadas partidas e dispostas anarquicamente nas criptas da igreja. Estes macabros despojos eram pertencentes aos irmãos da Ordem Terceira que assim pretendiam aguardar a ressurreição no dia do Juízo Final em terreno sagrado. Uma das criptas, repleta de ossos e protegida por uma vidraça, é o que se oferece à vista dos actuais visitantes.
Quanto às capelas de ossos propriamente ditas, as ainda existentes podem agrupar-se, tipologicamente, em duas grandes regiões: a do Alentejo e a do Algarve. As primeiras são menos elaboradas do ponto de vista decorativo, mais “pesadas” — leia-se barrocas — devido a um verdadeiro “horror ao vazio”, contando com o exemplo mais espectacular, o de Évora. As capelas algarvias apostam numa maior delicadeza decorativa, buscando reduzir as ossadas a ornatos mais ou menos “inocentes” — leia-se, “disfarçados” —, o que as identifica, formal e cronologicamente, com o rococó.
                O caso da capela de Coimbra, pretensamente constituída pelos ossos dos cristãos tombados no campo da mítica batalha de Ourique, é extremamente interessante, não só por a sua antiguidade situar a respectiva construção entre 1533 e 1541, mas pela ligação perfeitamente evidente que é estabelecida, desde o primeiro momento, entre a dita capela e um autêntico culto da figura de D. Afonso Henriques levada a cabo pelos frades Crúzios, que tudo tentaram junto de D. João III, e deste junto da Santa Sé, para obterem a canonização do nosso primeiro rei. Em vão.
Como se vê, não são poucas as reflexões suscitadas por estas pobres construções, ainda pouco conhecidas — a capela de ossos da Igreja de S. Sebastião de Lagos era até desconhecida de muitos dos seus vizinhos mais próximos! — e menos estudadas ainda.  Desprezadas pelos poderes públicos, é o culto popular das Almas do Purgatório, associado à curiosidade mórbida de muitos turistas, que as vai mantendo de pé. A capela de ossos de Évora é o monumento mais visitado de Évora, apenas a par, talvez, do Templo de Diana, de que não há, obviamente, registo das visitas, visto ser um monumento aberto, ao ar livre.
De facto é o gosto pelo  exótico misturado com o macabro, tão popular em todos os tempos, mas principalmente na nossa época, que acaba por levar a melhor. É uma estética do horrível que conduziu à muito rentável visualização do terror em todas as artes visuais, da pintura ao cinema.

   
                    
                    

sábado, 17 de fevereiro de 2018



GIORDANO BRUNO NO 

ANIVERSÁRIO DO SEU

MARTÍRIO

Carlos Rodarte Veloso


Correio Transmontano, 17 de Fevereiro de 2018



O monge dominicano Giordano Bruno (1548-1600) é um dos mais surpreendentes e corajosos filósofos do século XVI. Segundo Vítor Matos e Sá, ele e o espanhol Francisco Suárez seriam “os dois únicos grandes filósofos da época moderna anteriores a (Francis) Bacon e a Descartes”.
Numa época de predomínio do pensamento único em torno da interpretação do mundo, dominado pelos dogmas religiosos do Catolicismo e dos seus novos grandes rivais, o Luteranismo, o Calvinismo e o Anglicanismo, ele viveu sempre no fio da navalha.
Doutorado em Teologia, rapidamente manifestou ideias consideradas suspeitas pela hierarquia católica, acabando por ser julgado em Roma, onde acabou por abandonar o hábito, tinha então 31 anos. Em Génova ter-se-ia convertido ao Calvinismo, o que lhe valeu a excomunhão da Igreja romana, tendo sido a seu tempo também excomungado pelos calvinistas e, finalmente pelos luteranos. É inacreditável um tamanho desafio à capacidade de sobrevivência num mundo dominado pela intolerância e a subordinação às directrizes religiosas mais fundamentalistas.
Desde então, a vida de Giordano Bruno torna-se uma constante peregrinação por essa Europa, sempre perseguido, ao mesmo tempo que, com o apoio inconstante de diversos mecenas, publicou muitas das suas obras, muitas delas totalmente “heréticas” defendendo, antes de Galileu, as teorias de Copérnico sobre a rotação e a translação da Terra à volta do Sol, mas também a constituição atómica da matéria, já presente, desde a Antiguidade em Demócrito, Epicuro e Lucrécio. No entanto, a “cereja em cima do bolo” gulosamente aproveitada pela Igreja católica, foi a sua contestação entre muitas outras, do carácter sagrado das Sagradas Escrituras, dos sacerdotes e da própria divindade de Cristo, escândalo dos escândalos.
A sua fuga para Veneza, aparentemente uma cidade de livre-pensamento, acabou por ser a armadilha que o enviou para as mãos da Santa Sé, onde foi submetido a um longo e penoso julgamento durante oito anos.
A sua coragem e dignidade não lhe permitiram o fácil caminho da retractação. Não abjurou e foi assim condenado à morte na fogueira. Em 17 de Fevereiro de 1600, há 418 anos portanto, foi a queimar no Campo dei Fiore, no coração de Roma, uma das inteligências mais brilhantes do seu século. A estátua que lhe foi erigida nesse mesmo local, foi a indispensável homenagem e a reparação possível ao seu espírito rebelde e às geniais intuições que o acreditam entre os maiores construtores da Ciência, os gigantes sobre cujos ombros se elevaram outros tantos gigantes, até ao nosso tempo.

(Foto C.Veloso)

sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018



DO CARPE DIEM À VANITAS

Carlos Rodarte Veloso

“O Templário”, 15 de Fevereiro de 2018



O estudo da imagem é fundamental na interpretação das artes plásticas, embora os mesmos temas possam ter interpretações diametralmente opostas consoante as épocas em que são produzidos e as ideologias então dominantes.Um dos casos mais interessantes pelo seu contraste, é o das representações de caveiras ou, mesmo, esqueletos, que são conhecidas desde a Antiguidade como avisos para as consequências das formas de comportamento humanas. Um mosaico de Antioquia com c. 2400 anos mostra um esqueleto reclinado legendado, tal como numa banda desenhada moderna, pela frase em Grego, “sê feliz, aproveita a vida”. Também na Antiga Roma, a representação de grupos de esqueletos a dançar, ou caveiras acompanhadas de objectos que simbolizam a efemeridade da vida, são convites ao “carpe diem”, isto é, ao gozo dos prazeres dos sentidos, isto é, da vida, antes que a morte tudo venha destruir. Há aqui um convite ao prazer, de forma alguma considerado pecaminoso na cultura romana pagã. Assim, o mais célebre dos vestígios dessa ideologia da sensualidade, claramente epicurista, está representada numa luxuosa taça de prata esculpida com um friso de esqueletos dançantes, destinada ao vinho (fig.1) e encontrada nas ruínas da villa romana de Boscoreale, próximo de Pompeia que, tal como a cidade do Vesúvio, foi destruída durante a erupção do ano 79 d.C.


Com o triunfo do Cristianismo e sua recusa sectária do prazer, a arte medieval passa a englobar mensagens cuja forma, sendo semelhante à da Antiguidade – de novo esqueletos dançantes ou caveiras, associadas a velas apagadas, relógios, livros, instrumentos musicais, objectos científicos e de luxo – remete para a recusa pura e simples do prazer, única forma considerada segura de evitar a danação eterna, o Inferno. Agora esta figuração macabra aponta para as coisas vãs da vida – a “vãdade”, ou seja, a vaidade a que chamam Vanitas – e tem o seu triunfo a partir 1347, quando a Peste Negra começa a assolar a Europa.As cenas que antes convidavam ao prazer, são agora denominadas “danças macabras”, arrastando num turbilhão infernal humildes e poderosos, reis e papas, guerreiros e monges, e todas as classes sociais e sexos (fig. 2). 




Essa associação entre a Morte e o Poder não poderia ser mais transparente do que no quadro de Holbein, “Os Embaixadores” (fig.3) que ostenta, em primeiro plano, uma anamorfose – imagem disfarçada e deformada  – da Vanitas, uma caveira que só pode ser evidenciada mediante o uso de um cilindro óptico funcionando como lente. Em segundo plano, os símbolos do Poder, da Ciência e das Artes – e os próprios embaixadores –  como se vê, armadilhas para perder as pobres almas dos pecadores, sejam eles poderosos senhores, estudiosos, teólogos, frades... sendo a Ciência, tal como a Beleza, uma das portas do Inferno.


Outros exemplos se poderão apontar, uns mais macabros que outros, mas nos séculos XVI e XVII, ensanguentados por contínuas guerras religiosas, é especialmente arrepiante “O Triunfo da Morte” de Bruegel o Velho. O quadro de Pieter Claesz, “Vanitas” (fig. 4), tema recorrente da contraditória condição humana, é um bom representante dessa tendência, que apresenta inúmeras variantes, que também podem ser integrados na classificação de “naturezas mortas”.




 As “capelas de ossos”, totalmente revestidas de ossos, de que há vários excelentes exemplos em Portugal, são matéria abundante da condenação da Vanitas, embora especialmente votadas aos espaços religiosos monacais onde constituiam matéria de reflexão para a aspiração ascética a uma “boa morte”.  Aliás, a presença de uma caveira, também símbolo da penitência, é atributo de diversos santos, como S. Jerónimo, S. Francisco de Assis, S. Francisco Xavier, Santa Maria Madalena, S. Bruno, e tantos outros.

quinta-feira, 15 de fevereiro de 2018


OS EUCALIPTOS ESTÃO DE NOVO A CRESCER NOS CAMPOS ARDIDOS!!! 
SERÁ QUE NUNCA MAIS SE APRENDE?
Carlos Rodarte Veloso
Assim, a tragédia nunca se acaba! Por favor, cortem já esse veneno que são os eucaliptos! Depois venham queixar-se do Governo, da Protecção Civil, dos Bombeiros, das Autarquias, do raio que vos parta, mas nunca dos principais culpados, os proprietários gananciosos, os juízes que soltam os incendiários, os mandantes dos incendiários, as empresas e partidos que os financiam, as TVs que vivem disso... Já chega de demagogia e estupidez!

sábado, 10 de fevereiro de 2018



NATUREZA MORTA e "TROMPE L’OEIL" NA

HISTÓRIA DA ARTE


Carlos Rodarte Veloso


“O Templário”, 8 de Fevereiro de 2018

O conceito de “natureza morta” é quase tão antigo como a História da Arte, embora essa designação apenas surja, nas várias línguas europeias, a partir do século XVII, nomeadamente no Neerlandês. Anteriormente era associado a temas mais restritos, como a representação de fruta (fruytagie), de um banquete (bancket), ou de pequeno-almoço (ontbijt). Estas designações acabaram concentradas numa única, stilleven, significando objecto inanimado, ou natureza imóvel. Rapidamente adoptada em outras línguas, ficou “Natureza Morta” no Português, “Bodegón” no Castelhano (associado a “bodega” ou taberna), “Nature morte” no Francês, “Still life” no Inglês...
É conveniente acentuar uma característica que acompanha desde o berço este conceito artístico: o de um naturalismo extremo na representação dos produtos naturais que o constituem, a ponto de enganar o observador. Esse naturalismo enganador deu origem à noção de “trompe l’oeil” (literalmente, “engana o olho”), o mesmo que ilusão de óptica.
Um excelente exemplo, é o do pintor grego Zeuxis que, segundo o naturalista romano Plínio o Velho, teria pintado um quadro com uvas, de tal modo perfeito na ilusão, que pássaros o teriam debicado gulosamente. Não tendo chegado até nós qualquer pintura grega para além de pinturas em vasos e do “Rapto de Proserpina”, já pertencente à cultura helenística, resta-nos este testemunho de Plínio.
No entanto, são os próprios romanos, com os famosos frescos encontrados nas cidades destruídas pelo Vesúvio e noutras no Império Romano, que revelam a sua mestria no naturalismo genial com que criaram nas paredes das suas domus e villae, paisagens ilusionísticas representando jardins, vistas de cidades e bucólicas paisagens rurais, com um tal grau de sofisticação que revelam uma inesperada aproximação às regras da perspectiva que só viriam a ser desenvolvidas no Renascimento.
Do mesmo modo, quer em pintura, quer em mosaico, os romanos deixaram-nos ainda deliciosos apontamento de naturezas mortas tal como as classificávamos já na época barroca ou seja, reproduções de conjuntos de seres inanimados como frutos, flores, utensílios domésticos, em que a cerâmica e o vidro (fig.1) são magnífica e ilusionisticamente representados, alimentos ricamente confeccionados e apresentados, mas também animadas pela ocasional presença de animais vivos, muitas vezes verdadeiras obras-primas do naturalismo.

Fig. 1 - Fresco de Pompeia
Condenada pelos teólogos católicos durante a Idade-Média, a Natureza Morta vem a ressurgir no pré-renascimento associada a cenas generalistas, como acessório ou ornamento, só vindo a autonomizar-se no Maneirismo e no Barroco, com as primeiras naturezas mortas holandesas e italianas, nomeadamente a “Cesta de Fruta” de Caravaggio pintada c. 1596 (fig.2), revelando já propósitos não apenas naturalísticos, mas a introdução da ideia de transitoriedade da vida, evidente nas marcas de podridão reveladas em alguns frutos, o que convergia com um especíalíssimo tema, o da “vanitas”, também já documentado desde a Antiguidade em representações em que se associam objectos relacionados com a efemeridade da vida e, portanto, a “inutilidade” de quanto foi feito de notável por um ser efémero como o é o ser humano. Também se caracteriza pela presença de caveiras ou esqueletos humanos. A este conceito voltarei, em próximo texto.

Fig. 2 - Caravaggio, "Cesta com Fruta"

Caso também especialíssimo de “natureza morta” é boa parte da obra do pintor maneirista Arcimboldo, com os seus retratos e alegorias preenchidas com elementos heteróclitos, desde animais e vegetais, a livros e outros objectos culturais (fig.3), prenunciando o que viria a ser o Surrealismo do século XX.
Fig. 3 - Arcimboldo, "Água"
Entre tantos outros exemplos, é caso que especialmente nos interessa, o das naturezas mortas de Josefa de Óbidos, representando flores e os doces e outras iguarias preparadas nos conventos, hoje famosas especialidades regionais (fig.4), a par de cenas hagiográficas e de representações do “Agnus Dei”, ele próprio uma natureza morta. 




Fig. 4 - Josefa de Óbidos


domingo, 4 de fevereiro de 2018


O BOM E O MAU JUIZ, FRESCO DO TRIBUNAL MEDIEVAL DE MONSARAZ

Carlos Rodarte Veloso




Esta pintura a fresco, do antigo Paço de Audiências do tribunal da vila de Monsaraz é do final do século XV mas, afinal, ainda bastante actual. Representa, sob o patrocínio de Cristo, máximo Juiz, dois julgamentos: à ESQUERDA, o do Bom Juiz, assistido pelos anjos; à DIREITA, o do Mau Juiz, de duas caras, assistido pelo Diabo e recebendo o preço da sua corrupção, duas belas perdizes... As perdizes caíram em desuso, mas foram substituídas por vantagens materiais bem mais interessantes: cargos públicos ou privados, bens materiais diversos, influências, um nunca acabar de vantagens. Sinais dos tempos...



quinta-feira, 1 de fevereiro de 2018


SEM PRETENDER SER MORALISTA, PENSO QUE AS REDES SOCIAIS PODEM SER EXTRAORDINARIAMENTE POSITIVAS PARA A EVOLUÇÃO DAS SOCIEDADES, MAS ESCONDEM TAMBÉM PROBLEMAS E DEFEITOS QUE AS PODEM, ATÉ, COMPROMETER
Com toda a consideração pelas amigos e amigas do FB que pensem diferentemente, para mim as redes sociais destinam-se a expressar opiniões sobre assuntos de interesse cultural, económico ou político nacional ou internacional e a debatê-los racionalmente, num forum alargado, não a expor os assuntos do âmbito familiar e muito menos os sentimentos íntimos de cada um. Para isso bastam os execráveis talk shows em que as estações de televisão são férteis ou a detestável coscuvilhice dos tablóides. É a diferença entre o espaço público e o privado! 
Assim como o espaço público é uma conquista democrática sagrada em que todos devemos intervir livre, honesta e abertamente, o espaço íntimo, tão sagrado como o público, deve ser reservado à nossa mais estrita individualidade. Sou totalmente contra o exibicionismo dos sentimentos familiares ou a divulgação do nosso ambiente doméstico... o que, além do mais,muitas vezes se tem revelado perigoso para a segurança de pessoas e bens. Viver numa montra não corresponde minimamente ao meu ideal de vida!