A “DEMOCRACIA ORGÂNICA” DO SALAZARISMO
Carlos Rodarte Veloso
“O Templário”, 4 de Outubro de
2018
"A boa vida do antigamente" |
No artigo de Sérgio Martins publicado n’O Templário da semana passada sob o título “50 Anos depois de
Salazar”, a par de diversa informação de duvidosa credibilidade sobre a
evolução política dos últimos anos do regime e a criação do PPD/PSD, é
introduzida, muito “oportunamente”, a figura do patético Cavaco Silva, na frase
pouco clara e dificilmente comprovável: “e, se não erro, no final juntou-se [ao
grupo-base de formação daquele partido] ”…
Cavaco Silva na oposição à ditadura, aquele cuja “coragem” é
comprovada pela sua famosa declaração de fidelidade e cumplicidade para com o
regime corporativo e a sua tibieza perante as críticas de governos estrangeiros
quando Presidente da República de Portugal, o seu alinhamento com todos os
poderes capitalistas?!
Para além desta declaração pouco fiável, evidentemente destinada a
manter em estado de latência o cadáver adiado de Cavaco, apenas “ressuscitado”
pelas suas declarações surrealistas recentemente surgidas de além-túmulo a
propósito da substituição da Procuradora Geral da República, são feitas algumas
considerações sobre o tipo de “democracia” anterior ao 25 de Abril de 1974, a
famosa “democracia orgânica” de Salazar.
Essa “democracia orgânica”, cujas características são transcritas
ipsis verbis da Wikipedia, teria sido continuada até aos nossos dias, segundo o
articulista, mantendo-se, não só o regime autoritário – mas não fascista, diz
ele! - dominado pelos grupos patriarcais de origem medieval, com o predomínio
do “chefe de família”, como pelas corporações profissionais que aqui são
assimiladas aos sindicatos de classe (!), mantendo-se o estado de atraso da
população, “comprovado” pelo aumento da emigração, enquanto o nível e a
qualidade de vida regridem, e a
desigualdade social se acentua!…
Ou seja: é de toda ignorada a abolição de instituições como a
Câmara Corporativa, as instituições locais e autárquicas de nomeação
governamental, a legalização dos partidos políticos e a independência dos
sindicatos perante o poder político, os direitos das mulheres, a Democracia
representativa, essa de facto a Democracia verdadeira e não a sua máscara, o
julgamento de corruptos e criminosos poderosos... Com o esforço dos partidos de
direita para o retrocesso dos direitos fundamentais e a manutenção e
aprofundamento de todas as desigualdades…
"Banho do povo"
Não é preciso enunciar todas as melhorias introduzidas nestes 50
anos porque toda a população com mais de 60 anos, se quiser ser sincera e tiver
olhos na cara, sabe demasiado bem do que estou a falar. Basta recordar as cenas
pungentes das nossas aldeias miseráveis, dos miúdos subalimentados e descalços,
com as “lamparinas” ranhosas a escorrerem do nariz, das estradas nacionais que
mais pareciam campos de minas, da esquálida e miserável “dieta” rural, dos
compadrios políticos e económicos então irresponsabilizados e protegidos pelas
“forças da ordem”, a vigilância e a repressão sobre as palavras e as ideias.
Quer mais, Dr. Sérgio Martins?
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