RAJOY, O NOVO "CAUDILLO" DA ESPANHA
Carlos Rodarte Veloso
(“O Templário”, 5 de Outubro de 2017)
No passado dia 1 de Outubro, três países ibéricos puseram em
prática os mecanismos políticos da participação popular. Três países?! Eu
explico.
De Portugal já sabemos: a esperada e esmagadora vitória do
Governo e a triste actuação do PSD e do seu ainda líder, Passos Coelho,
reconhecendo a derrota com o seu neurónio semi-activo e hesitando na
desistência com o outro, um tanto deficiente... Por outro lado, a alegada
vitória de uma Assunção Cristas bastante mais espevitada do que o mais
elementar bem-senso autorizaria, embandeirando em arco com a claríssima
transfusão dos votos do PSD para o seu pequeno partido, que continua a ser um
pequeno partido por muitos saltos que ela e os seus jovens apoiantes dêem, por
muita gritaria com que tentem disfarçar o enorme vazio desse “sucesso”... Mas a
comunicaçãozinha social da Direita apoia essa ficção, “logo existe”!
Os dois restantes países são a Espanha e a Catalunha, a
primeira parece que esquecida momentaneamente da Democracia aí instaurada após
a morte do “Caudillo”, o sanguinário ditador, o Generalíssimo Franco, esquecida
dos cravos rubros herdados do Portugal de Abril, regressando à violência pela
mão do seu primeiro ministro, o tresloucado Mariano Rajoy, disposto a
considerar todo um povo como criminoso. Um pequeno político infectado pelo vírus do autoritarismo,
repetindo em nome da “legalidade constitucional” as lições dos ditadores dos
anos trinta do século XX. Para ele, tal como para Franco, tudo é permitido em
nome de uma “Espanha una, grande e livre”, até as cargas da Guardia Civil
contra uma população indefesa, balas de borracha, a mais selvagem repressão que
não poupou sequer idosos, mulheres e crianças. Mais de oitocentos feridos
parece ser um preço demasiado alto para proclamar a “grandeza da Espanha”. E o
que mais virá, pois as cenas ocorridas na Catalunha do Primeiro de Outubro são
a vergonha de um país dito civilizado, enquanto a União Europeia se alheia em
parte deste “susto”, reconhecido como muito grave por muitos dos seus
dirigentes, e a ONU, honra lhe seja feita, exige um diálogo entre as partes, que
Madrid nem sequer teve em consideração.
O outro país, a Catalunha, resgatada pela sua coragem da
subalternidade de “região autónoma” ao enfrentar pacificamente, de peito
descoberto, a repressão das “forças de ocupação” de Castela, mobilizadas para
evitar a todo o custo o referendo que o seu povo deseja há tão longos anos. O
referendo que, embora algo ferido na sua legalidade pela destruição de muitos boletins
de voto – não decerto devido à declaração de “inconstitucionalidade” com que
Rajoy o crismou – o encerramento dos locais de votação, a repressão mais
sangrenta, conquistou mais de dois milhões de votantes e ganhou o direito de se
autoproclamar um Estado independente e Republicano, pela voz do seu Presidente
do Governo, Puigdemont, que para isso aguarda apenas o resultado da contagem
dos votos.
Assim vai a Península Ibérica, a “Jangada de Pedra”, como
José Saramago lhe chamou num dos seus momentos mais brilhantes de inspiração.
Mas não tenham ilusões os aprendizes de ditador: o milhão de mortos de uma
guerra civil que terminou há quase 80 anos e preparou uma outra guerra, ainda mais
terrível, a segunda mundial, serão – parece-me – suficientemente trágicos e
assustadores, para que uma réstea de esperança subsista acima do nacionalismo
desenfreado de um “Arriba España” que parece estar no espírito deste galego tão
arrogantemente castelhano que domina o governo de Madrid.
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