EDIFÍCIOS CIVIS DE TOMAR DO TEMPO DO
INFANTE
D. HENRIQUE
Carlos Rodarte Veloso
“O Templário”, 29 de Março de 2018
"Continua-se hoje a publicação de excertos do meu
trabalho “Urbanismo e Arquitectura Civil de Tomar na Época da Expansão”
Ainda
em tempo do Infante D. Henrique, começava a desenvolver-se a “baixa” tomarense,
ao mesmo tempo que eram construídos os edifícios destinados a abrigar as
infra-estruturas económicas e administrativas indispensáveis a esse
desenvolvimento. Teria sido no “Chão do Pombal” — hoje Praceta Alves Redol —,
onde Gualdim Pais entregou o primeiro foral a Tomar e onde, em 1326, D. Afonso
IV teria reunido o povo junto a um alpendre, o local escolhido para esses
edifícios.
As
construções sucessivamente edificadas nesse espaço tiveram diversa denominação
e diferentes funções e evolução: até à morte do Infante, foram os Paços da Ribeira ou da Várzea Grande, os mais antigos. No
reinado de D. Manuel, o pelourinho da Vila, aí implantado, foi mudado para a
actual Praça da República. Desde aí fala-se em Celeiro e Cubos,
tratando-se, apesar da menor nobreza das funções, de casa sobradadas e com
elementos arquitectónicos e decorativos de qualidade: um belo portal rematado
pela Cruz de Cristo e datado de 1537, servia de entrada à loja do azeite do D.
Prior, sendo hoje a porta principal do edifício do Turismo. Também um portal
maneirista, de 1618, que era a entrada principal para os Cubos, se manteve no local até 1965, quando a construção da Ponte
Nova demoliu quanto restava daquele complexo económico que também ficou
conhecido como Paço dos Cubos,
equívoco evidente já que não se tratava de um espaço áulico, mas produtivo.
Parece que esta confusão se deve à vizinhança dos Estaus, par de edifícios mandados construir pelo Infante D.
Henrique, onde teria falecido, vitimado pela peste, o rei D. Duarte no ano de
1438, referidos como “Paços”. As condições da sua morte são desconhecidas, bem
como o motivo da sua associação a edifícios que dificilmente seriam
considerados dignos de um rei quando, como vimos, eram os Paços do Infante, no
Convento, o local adequado à permanência das altas individualidades,
maioritariamente o monarca.
Os
Estaus, ladeando a actual Rua dos
Arcos (Fig. 1 – Reconstituição pelo arquitecto João Pedro de Figueiredo Mota Lima, 1960, in Figueiredo e Silva, União
dos Amigos dos Monumentos da Ordem de Cristo, vol. IV, Tomar, 1960), “teriam
sido criados com o intuito de proporcionar poiso aos feirantes e aos que à
feira – pouco antes criada – ocorriam, a outros forasteiros e ainda à criadagem
dos Mestres de Cristo e dos seus freires que viviam então pela cidade para
evitar as reclamações da população contra os direitos de aposentadoria que se
conhecem da época”, segundo Fernandes Sanchez Salvador e Tatiana Sousa Coelho
no artigo de 2012 Os Estaus da Cidade de Tomar, publicado em http//disegnarecon.unibo.it).
Da
construção, inacabada, de que apenas
sobrevivem duas arcadas libertas de outras construções, encontram-se as
restantes, que não foram demolidas, integradas no complexo edifício, sujeitas
que foram a modificações e adições devidas ao novo uso habitacional que
sofreram ao longo dos tempos.
Estas
construções, atribuídas por Costa Rosa aos artífices do Claustro da Lavagem, devido
a semelhanças formais e à identidade das siglas verificada nos dois monumentos,
teriam sido edificadas depois de 1438, decerto devido aos protestos do povo,
nas Cortes de Lisboa desse ano, precisamente contra os inumeráveis abusos
cometidos pela nobreza ao usar do “direito de aposentadoria”.
Obra
igualmente de grande valor social foi a criação do Hospital de Santa Maria da Graça, mandado construir pelo Infante
que, para isso, juntou os catorze hospitais e hospícios medievais, então
espalhados pela Vila. O único desses edifícios que ainda resta sob uma forma
bastante próxima das origens é o humilde Hospital
de S. Brás, junto à entrada da Mata dos Sete Montes, a área florestal
pertencente à Cerca do Convento de Cristo.
Com
a morte do Infante D. Henrique, em 1460, Tomar finaliza um ciclo decisivo da
sua evolução. Mesmo que ele não tenha responsabilidades na organização do seu
traçado viário, a sua administração preparou a Vila para os desafios de um
tempo que ele próprio preparou, quando enviou as primeiras barcas ao encontro
do desconhecido…
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