sexta-feira, 11 de maio de 2018


AS CASAS DE PEDRO ÁLVARES 
SECO DE FREITAS 


Carlos Rodarte Veloso


“O Templário”
10 de Maio de 2018

"Continuação de “Urbanismo e Arquitectura Civil de Tomar na Época da Expansão”

Na Rua da Perizilha residia, em “boa casa”, Pedro Álvares Seco de Freitas, fidalgo e jurista falecido em 1590, ano em que foi sepultado no Claustro do Cemitério do Convento de Cristo, que era também grada figura da Tomar renascentista. É famoso como cronista dos Templários e da Ordem de Cristo, por encargo do rei D. João III (1552), tendo escrito, mais tarde e a pedido da rainha D. Catarina, o Tombo das Rendas e Direitos do Convento de Tomar e Comendas, obras todas elas da maior importância como fonte histórica desta região. Após a sua morte, a rua ganhou-lhe o nome, corrompido — Peralves Seco — que veio mais tarde a mudar para Rua da Capela quando, na segunda metade do século XVIII, aí se instalou Francisco Afonso de Lima, onde fez construir capela dedicada a S. Francisco de Assis. 
A sua casa, hoje ocupada pela Sociedade Nabantina, cuja fachada dá para a Rua Silva Magalhães, recuou em relação à construção mais antiga que presumivelmente substituiu, o que é corroborado pelo desalinhamento em que acabou por ficar o antigo edifício da Biblioteca Municipal de que já se falou, o qual, foi desmontado e voltado a montar já no novo alinhamento…

O proprietário setecentista terá construído o seu palácio, pelo menos em parte, precisamente sobre o local original da Casa de Pedr’Álvares. Além do já referido desalinhamento depois “corrigido”, o quarteirão em que se encontra parece demasiado pequeno para integrar outra grande construção. Tratar-se-ia, decerto, de uma boa casa renascentista, mas falta-nos em absoluto qualquer indicação mais precisa sobre as suas características.
Como facto digno de interesse, refira-se que o referido Francisco Afonso de Lima foi pai de António Florêncio de Araújo que viria a casar-se, em 1795, com outra verdadeira glória da história tomarense, Ângela Tamagnini, a corajosa mulher que intercedeu pelos revoltosos de Tomar junto do comandante invasor, em 1808, conseguindo evitar represálias sobre a população que lhe entregou as armas, de forma a não ter que as entregar aos franceses. Segundo a tradição, as espingardas cujos canos constituem os balaústres das varandas do jardim da casa, seriam precisamente algumas dessas armas.
Também ligadas ao Dr. Pedro Álvares Seco de Freitas, que ao tempo de D. Sebastião instituiu vínculo em Tomar, são as Casas Nobres, cabeça do mesmo morgadio, mas que as entidades oficiais insistiam — e insistem — em chamar “Palácio Alvim” (Fig.1), “imprópria e teimosamente”, segundo o protesto indignado de Amorim Rosa.


O dito complexo arquitectónico era possivelmente a mais importante propriedade urbana de Tomar, pela considerável dimensão dos edifícios que, com a sua Cerca plantada de loureiros e horta, era limitada pela Rua do Pé da Costa — hoje Rua do Dr. Sousa — e se estendia pela encosta, entre a Calçada do Convento e a Calçada de S. Tiago. 
Marca também da sua importância eram a “casa de regalo”, a mina e a cascata aí existentes, atributos exclusivos de uma qualidade de vida apenas ao alcance das classes privilegiadas, como aliás competia a um fidalgo da sua categoria que, segundo Amorim Rosa, teria sido “escudeiro da Infanta D. Isabel, desde 22 de Setembro de 1533 […]”.Esta particularidade constitui uma verdadeira contradição, pois não existia nenhuma “infanta D. Isabel” à data indicada por aquele autor… Tiveram essa designação a filha de D. João III, falecida em 1529, de tenra idade, e a célebre filha de D. Manuel, casada em 1526 com o imperador Carlos V (e I de Espanha), desde essa data rainha de Espanha e imperatriz da Casa de Áustria, que foi mãe de Filipe II, pintada por Ticiano e uma das mulheres mais admiradas do seu tempo… Não podia ser uma nem outra, aquela por ser falecida àquela data, esta por não ser já Infanta nem residir em Portugal. Trata-se, provavelmente, dum lapso cronológico, tipo de erro muito comum em Amorim Rosa.
A administração do vínculo foi continuada por seu sobrinho Bento de Castro de Freitas, falecido sem descendência, pelo que foi passado a D. Susana de Freitas de Castro, cuja pedra sepulcral armoriada jaz em frente à capela colateral do lado da Epístola da Igreja de S. João Baptista. As sucessivas transmissões do morgadio levaram-no da família do marido de D. Susana, os Pimentel Maldonado, a Timóteo de Sousa Alvim, de quem nasceu a designação de “Palácio Alvim”.
Foi seu último proprietário o Dr. João Maria de Sousa, reputado médico cujo nome foi atribuído à rua do palácio e se notabilizou como autor de um famoso estudo sobre a Cidade, Thomar, editado em 1903.
Adquirido pelo Município, foi a sede da Polícia de Segurança Pública de Tomar, mantendo um cunho quinhentista, embora ostentando numerosos elementos barrocos, provenientes das diversas obras efectuadas ao longo dos tempos. São também dignos de interesse os painéis de azulejos setecentistas situados no respectivo átrio. É ainda um belo e imponente edifício, dominando a maior parte da banda ocidental da Rua do Dr. Sousa, digno dos pergaminhos do seu ilustre fundador.



FOTO: C.Veloso

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