sexta-feira, 4 de maio de 2018



EDIFÍCIOS CIVIS RENASCENTISTAS DE TOMAR

4.NA ÁREA DA AVENIDA CÂNDIDO MADUREIRA

Carlos Rodarte Veloso
"O Templário"
3 de Maio de 2018


"Continuação  de “Urbanismo e Arquitectura Civil de Tomar na Época da Expansão” 


A Rua de Pedro Dias e parte da antiga Rua da Graça — hoje Avenida Dr. Cândido Madureira — limitam um espaço habitado que ainda hoje apresenta vestígios quinhentistas bastante adulterados mas ilustrativos da nobreza dos seus ocupantes. A décadas de destruições, sobrevivem dois edifícios nobres, tendo sido demolido um outro, em 1955, apesar do protesto de alguns notáveis da Cidade, nomeadamente o de Eugénio de Figueiredo e Silva. Assim aconteceu com a casa quinhentista da Rua da Graça, “com varanda alpendrada e boa colunata”, a que dava acesso uma escadaria, que foi demolida sem contemplações, para no seu lugar se construir um edifício de quatro andares, em flagrante contraste com a zona histórica envolvente. Conheço bem o edifício que o substituiu, porque aí morei durante quase 20 anos. As cantarias originais foram oferecidas pelo proprietário à União dos Amigos dos Monumentos da Ordem de Cristo, sendo de destacar algumas vergas de recorte manuelino.
Exemplar na fuga a responsabilidades, é o verdadeiro “jogo de empurra” que então houve entre a Câmara, a Direcção Geral dos Monumentos Nacionais e a Direcção Geral do Ensino Superior e das Belas Artes, em que se recorreu a tudo, desde obstáculos burocráticos e “falta de verba”, à sugestão de ser o edifício “pobre de arquitectura” e à tentativa — frustrada — de o “despachar” para outras instituições estatais… não muito diferente, afinal, de outros “jogos de empurra” bem nossos conhecidos…
 

Melhor sorte teve o Palácio dos Velhos de Macedo (Fig.1), situado na mesma rua, um pouco acima, cuja construção deve ser pouco posterior a 1550 e que, segundo Amorim Rosa, era de Gonçalo Velho Cabral, navegador famoso a quem o Infante D. Henrique confiou o primeiro povoamento dos Açores. A sua frontaria apresenta duas janelas com avental boleado, ladeadas por duas de sacada. Tem também frente para a Travessa do Arco, que atravessa com um passadiço e para a Rua de Pedro Dias, em cuja esquina apresenta uma belíssima janela de esquina de avental lavrado ao gosto renascentista, infelizmente bastante danificado (Fig.2). Parte do edifício é ainda propriedade e residência de descendentes do proprietário original.

Na Rua de Pedro Dias, fronteira ao edifício anterior, há ainda a assinalar a também quinhentista Casa dos Tassos Figueiredo (Fig.3), herdeiros do Conselheiro Baima de Bastos, em que sobressaem as janelas alternadas de sacada e peitoril, estas de avental almofadado. De referir as mísulas divergentes — ou perspectivadas — das vergas das janelas, à maneira das da Igreja de Nossa Senhora da Conceição, que fizeram Vieira Guimarães considerá-las obra de Diogo de Torralva a quem era então atribuída aquela obra. Os conhecimentos hoje adquiridos permitem atribuir a João de Castilho essa belíssima igreja, sendo Diogo de Torralva quem a terminou, pelo menos na parte arquitectonicamente mais nobre. Em qualquer dos casos, não seria decerto nenhum deles o autor da casa da Rua de Pedro Dias, visto serem ambos mestres das obras régias e senhores de alto estatuto social, não lhes sobrando decerto tempo — ou dignidade… — para empreitadas particulares. Além disso não faltariam então, em Tomar, exímios artífices provenientes dos estaleiros das grandes obras então em curso, perfeitamente qualificados para encomendas desta índole e, como é óbvio influenciados por aquelas.
Noutra ramificação da Rua da Graça encontramos a casa de Aires do Quental, feitor-mor de D. Manuel I e de D. João III, bem conhecido por ter mandado construir a ermida de S. Lourenço e ter feito “corrigir”, em 1530 e por ordem real, “ho rio desta villa de Tomar para se por ele navegarem hos bates [batéis] de Punhete”. A sua casa, na Travessa ainda hoje chamada “do Quental”, mantém as belas janelas com aventais de cantaria e almofadas geminadas, e a característica varanda alpendrada. Foi habitada por descendentes seus até tempos recentes, tendo estado o escritor Antero de Quental ligado a esta família, segundo Romualdo Mela.
Fotos: C.Veloso

Sem comentários:

Enviar um comentário