segunda-feira, 6 de março de 2017


À BEIRA DO ABISMO
Carlos Rodarte Veloso

Publicado n’”O Templário” de 26-1-2017


                     E pronto, lá está o presidente da “America first”, pronto a esmagar todas as dificílimas melhorias que Obama introduziu no país agora dominado pelos seus bárbaros trogloditas que, esses sim, deveriam estar no lugar para onde no passado empurraram os “peles vermelhas”: em reservas desérticas, enfeitadas apenas com cactos, “cidades fantasmas” e com a construção de casinos, uma forma como outra qualquer de adoração do deus-dinheiro e a garantia de serem mantidos sob vigilância apertada.
                    Cultores intransigentes da xenofobia mais básica, do racismo, do machismo e do ódio à novidade, cantam agora nas ruas os “novos tempos” que se encaixam nas ideologias mais retrógradas, fazendo regredir mais de duzentos anos de progressos científico-tecnológicos e sociais para os “tempos heróicos” da útima fronteira, dos cowboys e, claro, do salve-se quem puder de uma população armada até aos dentes, sempre pronta a fazer “justiça” pelas próprias mãos.
                    Isto tudo no contexto de um discurso de ódio e de uma barreira das mentiras mais grosseiras, em defesa do isolacionismo mais patético, ao mesmo tempo em que, paradoxalmente, se faz a apologia de entendimentos com a Rússia quase czarista e se agride estupidamente outra grande potência mundial, a China. E como convencer quem quer que seja de que a destruição do “Estado islâmico” pode ser concretizada dentro do tal isolacionismo, com um simples toque da varinha mágica do ataque maciço de toda a tecnologia de ponta que os EUA ainda dominam?
                    E onde fica a cultura, os valores humanísticos, a simples compaixão neste quadro inquietante? Fica entregue ao livre arbítrio dos cada vez mais poderosos senhores do Capital, das multinacionais, dos comerciantes de armas, dos beneficiários dos “offshores”, dos intransigentes do petróleo, num momento em que tudo apontava para a substituição dos combustíveis fósseis por formas de energia renováveis e assim, para defesa da Natureza, da Ecologia e, em primeira e última análise, da Humanidade..
                    O pior é que os “valores” desta gente que tudo leva a crer ter falseado os resultados de eleições, em que nem sequer representam a maioria dos eleitores, estão já a contaminar outros contimentes, nomeadamente a nossa Europa, incentivando “copycats” situados na extrema direita do espectro político, caso de Marine Le Pen, o mais emblemático e ameaçador no contexto actual. Também não é de todo inocente a inesperada (?) agressividade de Theresa May, PM do Reino Unido, a atrelar o Brexit aos “conselhos” de Trump, confessadamente desejoso da destruição final da União Europeia...
                    Donald Trump pode estar sossegado, porque ninguém tem feito tanto mal à União Europeia como os seus estafados líderes, gente sem princípios, sem imaginação e sem inteligência, mais interessados em dominar os elos mais fracos da comunidade do que em criar um poderoso entendimento entre os seus membros, assim capazes de trilhar novos caminhos de esperança. Essa gente faz parte do problema e o “America first” bem pode planear os seus próprios muros da vergonha, negar as alterações climáticas, apoiar os colonatos judaicos na Palestina, desafiar este mundo e o outro e coçar regaladamente a barriga na esperança de ver cair em pedaços uma civilização milenar a que não merece pertencer.
Imagens: 1. “Gótico americano” de Grant Wood; 2. Apoiante de Trump, armado.


 


             

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