A MULHER NA ARTE - II
Carlos Rodarte Veloso
Publicado n’”O Templário” de
23-2-2017
Na
sequência do artigo anterior, para além da mulher como objecto artístico, outra
perspectiva pode igualmente interessar-nos: é a da própria mulher como Artista,
como Criadora. Para começar, como artesã dos chamados lavores femininos, tanto
entre as classes altas como entre as laboriosas, mais uma forma de passar o
tempo do que uma actividade altamente prestigiada entre as mulheres ricas,
embora rentável e valorizada economicamente nas classes trabalhadoras.
Mas
é nas Belas-Artes que sobressaem, embora num número chocantemente diminuto,
alguns talentos, especialmente a partir da época barroca: Artemisia Gentileschi,
italiana, e Josefa d’Ayala, mais conhecida como Josefa de Óbidos, em Portugal,
além de algumas freiras pintoras em conventos.
O
caso de Artemisia Gentileschi é especialmente interessante. Filha de um pintor
de razoável notoriedade, Orazio Gentileschi, uma das suas obras mais
significativas representa a decapitação de Holofernes pela heroína judaica,
Judite, tema bíblico bastante popular em todas as épocas, que representa uma
das raras mulheres que ultrapassam a sua condição de inferioridade ao vencer um
tirano sanguinário valendo-se apenas da sedução e, só no final, da violência
mais brutal. Esta obra é produzida “a quente”, na sequência da violação da
jovem pintora, cuja queixa junto das autoridades romanas é recebida com ironia
e sem quaisquer efeitos legais. Nasce assim o quadro provavelmente mais
catártico da História da Arte (Fig. 1 – “Judite e Holofernes” de Artemisia
Gentileschi).
O
caso de Josefa de Óbidos, pintora muito próxima da vida conventual portuguesa,
filha também de pintor, neste caso de “bodegones” – nome espanhol para
“naturezas mortas” – está marcado pela devoção religiosa e alguma ingenuidade
no tratamento dos temas, que tanto podem ser as imagens do Menino Jesus ou
outras devocionais que povoavam essas casa religiosas, como riquíssimas
naturezas mortas”, com doces, frutos e outras guloseimas também abundantes
nesses locais e que antecipam as futuras especialidades gastronómicas que tanta
fama têm trazido a Portugal (Fig. 2 – “Natureza morta” de Josefa de Óbidos).
Com a evolução
artística, novas artistas surgem, lutando por um lugar ao sol perante a
supremacia masculina. Em vésperas da Revolução Francesa, Elisabeth Vigée Le
Brun, pintora da Corte de Maria Antonieta, que conseguiu sobreviver à sua
patrona, era uma excelente retratista, com rara sensibilidade (Fig. 3 – “Auto-Retrato”
de Elisabeth Vigée Le Brun).
A
partir do final do século XIX, novas artistas se notabilizam como Camille
Claudel, discípula, companheira e rival de Rodin (Fig. 4 – “Pensamento
profundo” de Camille Claudel), e Berthe Morisot, pintora impressionista.
Em Portugal, Aurélia de Souza conjuga o Naturalismo com correntes mais vanguardistas e a discípula de
Malhoa, Maria
de Lourdes de Mello e Castro, de Tomar, arrasta
o Naturalismo até meados do século XX, num conservadorismo bem fiel às lições
do seu mestre.
Tamara de
Lempika e Claire Colinet, na primeira metade do século XX, representam o
movimento Arte Déco, e Frieda Kahlo, mais que o Surrealismo em que não
se revia, o Realismo Fantástico, em paralelo com a Literatura latino-americana
contemporânea.
A partir de
meados do século XX, Sónia Delaunay e Maria Helena Vieira da Silva são
excelentes representantes do Abstraccionismo. Outro nome grande da arte
portuguesa e mundial dos séculos XX e XXI é o de Paula Rego, por muitos
considerada a maior pintora viva.
Os dois
últimos séculos são, assim, bem representativos da entrada de numerosas
artistas no panorama artístico mundial, sem qualquer diminuição relativamente
aos seus pares masculinos.
Sem comentários:
Enviar um comentário