sábado, 25 de fevereiro de 2017


A MULHER NA ARTE - II
Carlos Rodarte Veloso
Publicado n’”O Templário” de 23-2-2017



                Na sequência do artigo anterior, para além da mulher como objecto artístico, outra perspectiva pode igualmente interessar-nos: é a da própria mulher como Artista, como Criadora. Para começar, como artesã dos chamados lavores femininos, tanto entre as classes altas como entre as laboriosas, mais uma forma de passar o tempo do que uma actividade altamente prestigiada entre as mulheres ricas, embora rentável e valorizada economicamente nas classes trabalhadoras.
                Mas é nas Belas-Artes que sobressaem, embora num número chocantemente diminuto, alguns talentos, especialmente a partir da época barroca: Artemisia Gentileschi, italiana, e Josefa d’Ayala, mais conhecida como Josefa de Óbidos, em Portugal, além de algumas freiras pintoras em conventos.
                O caso de Artemisia Gentileschi é especialmente interessante. Filha de um pintor de razoável notoriedade, Orazio Gentileschi, uma das suas obras mais significativas representa a decapitação de Holofernes pela heroína judaica, Judite, tema bíblico bastante popular em todas as épocas, que representa uma das raras mulheres que ultrapassam a sua condição de inferioridade ao vencer um tirano sanguinário valendo-se apenas da sedução e, só no final, da violência mais brutal. Esta obra é produzida “a quente”, na sequência da violação da jovem pintora, cuja queixa junto das autoridades romanas é recebida com ironia e sem quaisquer efeitos legais. Nasce assim o quadro provavelmente mais catártico da História da Arte (Fig. 1 – “Judite e Holofernes” de Artemisia Gentileschi).
                O caso de Josefa de Óbidos, pintora muito próxima da vida conventual portuguesa, filha também de pintor, neste caso de “bodegones” – nome espanhol para “naturezas mortas” – está marcado pela devoção religiosa e alguma ingenuidade no tratamento dos temas, que tanto podem ser as imagens do Menino Jesus ou outras devocionais que povoavam essas casa religiosas, como riquíssimas naturezas mortas”, com doces, frutos e outras guloseimas também abundantes nesses locais e que antecipam as futuras especialidades gastronómicas que tanta fama têm trazido a Portugal (Fig. 2 – “Natureza morta” de Josefa de Óbidos).
Com a evolução artística, novas artistas surgem, lutando por um lugar ao sol perante a supremacia masculina. Em vésperas da Revolução Francesa, Elisabeth Vigée Le Brun, pintora da Corte de Maria Antonieta, que conseguiu sobreviver à sua patrona, era uma excelente retratista, com rara sensibilidade (Fig. 3 – “Auto-Retrato” de Elisabeth Vigée Le Brun).
                A partir do final do século XIX, novas artistas se notabilizam como Camille Claudel, discípula, companheira e rival de Rodin (Fig. 4 – “Pensamento profundo” de Camille Claudel), e Berthe Morisot, pintora impressionista.

Em Portugal, Aurélia de Souza conjuga o Naturalismo com correntes mais vanguardistas e a discípula de Malhoa, Maria de Lourdes de Mello e Castro, de Tomar, arrasta o Naturalismo até meados do século XX, num conservadorismo bem fiel às lições do seu mestre.

 

Tamara de Lempika e Claire Colinet, na primeira metade do século XX, representam o movimento Arte Déco, e Frieda Kahlo, mais que o Surrealismo em que não se revia, o Realismo Fantástico, em paralelo com a Literatura latino-americana contemporânea.
A partir de meados do século XX, Sónia Delaunay e Maria Helena Vieira da Silva são excelentes representantes do Abstraccionismo. Outro nome grande da arte portuguesa e mundial dos séculos XX e XXI é o de Paula Rego, por muitos considerada a maior pintora viva.

Os dois últimos séculos são, assim, bem representativos da entrada de numerosas artistas no panorama artístico mundial, sem qualquer diminuição relativamente aos seus pares masculinos.




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