sexta-feira, 25 de agosto de 2017


VIGO E AS RIAS BAIXAS

Carlos Rodarte Veloso

(Publicado no "Correio Transmontano", 24-8-2017)

            Se há regiões de Espanha em que nos podemos sentir “em casa”, a Galiza é a primeira entre todas. Herança comum é a luta pela afirmação de uma identidade política e cultural face ao resto da Espanha — Castela… — e de uma língua, o Galaico-Português, com que foram escritos alguns dos mais belos poemas medievais peninsulares, como os de Martin Codax, de Vigo, cujo lirismo mantém toda a frescura das coisas intemporais:
                                   “Ondas do mar de Vigo
                                   se vistes meu amigo
                                   e ay Deus, se verra cedo! […]”


           E é com Vigo, precisamente, que os portugueses têm uma relação mais próxima. Situada na província de Pontevedra, é hoje a maior cidade galega e o seu desenvolvimento atrai turistas portugueses em busca de compras no comércio local, em que se destaca os armazéns do Corte Inglés, mas a cidade, embora de imagem moderna, tem bem melhores motivos para merecer uma visita.

            Para começar, a sua modernidade aparente esconde um passado conflituoso de que muitas das suas construções foram vítimas. Assim aconteceu com a mais importante, a Igreja Colegiada de Santa Maria, construída na Idade Média, destruída pelo corsário inglês Francis Drake no século XVI e reconstruída muito mais tarde, no estilo neo-clássico. Atacada e algumas vezes pilhada ao longo dos séculos, viu-se assediada por Normandos, Muçulmanos, Turcos, Portugueses, Ingleses e Franceses…
Conheceu também a peste e várias guerras civis. As suas largas avenidas não ostentam sinais do passado, mas pode-se admirar, entre outros, o notável conjunto escultórico moderno da Praça de Espanha, Os Cavalos  de Juan José Oliveira, que parecem elevar-se ao céu numa espiral de bronze. Para encontrar o seu passado, nada melhor que visitar o Museu Quiñones de Léon onde, a par de obras de arte de várias épocas, se encontra os vestígios de uma pré-história que tem muito de comum com a do Norte dePortugal, nomeadamente com os seus castros célticos e os espigueiros a que os galegos chamam “hórreos”.
            Do alto do seu mirante da colina de O Castro, na cidade e, especialmente, do Mirador da Madroa, nos arredores, domina-se o panorama da Ria de Vigo, uma das Rias Baixas e o seu maior motivo de orgulho. É que falar das Rias Baixas é falar da relação íntima dos Galegos com o Atlântico, do seu poder piscatório, do seu desenvolvimento industrial e comercial, e da gastronomia em que predominam os mariscos e outros produtos do mar. Mas, acima de tudo, falar delas é falar da beleza esmagadora dessa entrada profunda do mar entre colinas arborizadas, praias a perder de vista e, frequentemente, a névoa que tudo envolve num manto de poesia.

            Citando o grande escritor e pensador Unamuno, “dão as Rias Baixas a impressão de lagos semeados de ilhas. Uma faixa de terra cobre por todos os lados o horizonte destes tranquilos remansos do oceano. As inúmeras pequenas povoações das suas margens reflectem-se na água e em dias claros é como se as colinas e montanhas, revestidas de verdura, estivessem suspensas do próprio céu, que no seio da água se reproduz. Dorme o mar e talvez sonhe, nos braços da terra."

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