A ODISSEIA: ONDE NASCEM OS CONTOS
Publicado n’O Templário de 22 de Dezembro de 2016
Frederico Lourenço,
um dos mais completos homens de Cultura deste País, para além das dezenas de
magníficas obras de ensaio e ficção de sua autoria, é tradutor emérito do Grego
Antigo, competência essa que lhe permitiu produzir as traduções mais fidedignas
e apaixonantes de obras-charneira da Cultura universal como A
Ilíada e a A Odisseia de Homero (edição de Livros Cotovia), tendo agora
editado o 1º volume da Bíblia (da Quetzal Editores) traduzida
directamente do Grego helenístico e se acredita como a versão menos contaminada
pela Teologia católica que, de muitas formas manipulou os conteúdos, conclusões
e interpretações do Livro sagrado de Judeus e Cristãos.
Mas não é da Bíblia
que agora me ocuparei, mas da sua maravilhosa tradução da Odisseia, para mim uma
das obras máximas da Literatura, escrita cerca de 700 a.C. por um ou vários
poetas que conhecemos sob o nome – pseudónimo – de Homero.
Narra esta obra as
aventuras de Ulisses, rei de Ítaca e um dos líderes dos Gregos no cerco e
destruição de Tróia. É ele o inventor do “Cavalo de Tróia”, a artimanha usada
para conquistar a cidade condenada pelos deuses olímpicos à ocupação e
destruição. Essa parte da narrativa, A Ilíada, descreve os dez anos de
lutas em redor de Tróia e a morte do seu principal defensor, o príncipe Heitor
às mãos do herói Aquiles.
Os dez anos
subsequentes à destruição da cidade são ocupados pelas aventuras de Ulisses em
demanda da sua pátria longínqua, onde a cobiça do seu trono por pretendentes
locais, impõe à sua mulher, Penélope, o arquétipo da fidelidade conjugal, e a
seu filho Telémaco, seu digno descendente, a resistência habilidosa com que
foram adiando o reconhecimento de um facto julgado já adquirido, o da morte do
herói.
As aventuras de
Ulisses, cujo apoio da mais importante deusa de toda a Hélade, Atena, garantirá
a sobrevivência sobre as ondas de um mar hostil dominado pelo seu poderoso
soberano, o deus Poseidon, são o conjunto de narrativas com final feliz que de
alguma forma são a génese – hoje dir-se-ia a “incubadora” – de toda a ficção
ocidental.
Desde a ilha de Circe
ao episódio de Polifemo, o gigante filho de Poseideon, às Sereias e aos
monstros marinhos de Cila e Caríbdis, aos encantos da ninfa Calipso e à descida
de Ulisses ao Hades – os Infernos da mitologia grega - à chegada à ilha dos
Feaces, a actual Corfu e, finalmente, ao reconhecimento de Ulisses pelos seus
entes queridos e a sua subsequente e sangrenta vingança contra os pretendentes,
aqui encontramos toda a matéria que alimentou o imaginário popular e erudito de
tantas gerações até este momento.
Essa herança está nas
origens de contos populares de todas as culturas e de obras básicas da
Literatura universal, de Virgílio a Camões, de Dante a Shakespeare, de
Cervantes a Joyce.
Conhecer A
Odisseia é um acto básico de Cultura. E não há razões para continuar a ser
ignorada do grande público, tanto na sua forma total como em versões adaptadas
para jovens. Par mim, a tradução de Frederico Lourenço e a sua adaptação com o
mesmo nome, são a melhor resposta a essa necessidade.
É o “Cavalo de Tróia”
para o regresso desta obra à formação individual e colectiva das novas
gerações, tão ignorantes deste autêntico tesouro criado há mais de dois mil e
setecentos anos.
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