ARTE E CULTURA GERAL
Carlos
Rodarte Veloso
(Publicado na Correio Transmontano em 30-12.2016)
(Artigo modificado publicado no Cidade de Tomar em 13-3-1998)
Quando nos perguntamos sobre os
motivos da fraquíssima cultura geral manifestada pela grande maioria da
população que frequentou o nosso Ensino Secundário, surgem sempre várias
respostas que, no seu conjunto, decerto explicarão esse facto indesmentível.
Para começar, existe um deficiente ensino da Língua Portuguesa e essa lacuna
reflecte-se nos hábitos de leitura que, por sua vez, colocam o comum dos
cidadãos à mercê dos meios de informação mais imediatos, como a televisão, a
rádio e a Internet que, com muitas honrosas excepções, estão muitas vezes
apostados apenas na conquista de audiências pouco exigentes e, assim, se
limitam a difundir informação cultural o mais superficial possível e até
errónea sobre os mais diversos temas. Essa superficialização da cultura afecta
gravemente as possibilidades dos indivíduos para a compreensão efectiva do
mundo que os rodeia. Essa deficiência leva-os a conhecer, por vezes, os nomes
de muitos dos grandes vultos da humanidade, mas sem os relacionar minimamente com
as suas obras. No fundo, simples trivialidades.
Outro importante sector da referida
cultura geral é, sem dúvida, o artístico. Muita gente conhece a “Gioconda” ou a
“Última Ceia” de Leonardo, mas do mesmo modo que conhece a Torre de Belém e o
Manuelino, ou o Convento de Cristo e Gualdim Pais, ou a “5ª Sinfonia” de Beethoven…
Associa-se também alguns artistas às altíssimas cotações atingidas pelas suas
obras no mercado internacional … Van Gogh, Picasso, Rembrandt, são mais
“conhecidos” pelos milhões que “valem” os seus quadros do que pelo que pela sua
arte! São associações automáticas, não correspondendo, na maioria dos casos, a
um verdadeiro conhecimento das coisas, das causas ou dos efeitos. Trata-se
apenas de dinheiro.
O mesmo se passa noutras áreas cujo
conhecimento público se situa ao nível mais elementar como acontece com as
diversas Ciências, com a Literatura e a Filosofia.
Sem querer de modo algum depreciar estas
últimas, seja-me permitido debruçar-me muito brevemente sobre o papel
fundamental da Arte na formação global de cada indivíduo, especialmente importante
no que toca aos jovens, mais ainda por constituírem o grupo mais permeável às
mais negativas solicitações do meio.
Acontece que a atitude estética é
tão antiga como a humanidade e os vestígios dessa actividade cobrem todo o
planeta. A produção artística e a sua fruição, valores sem preço, são vitais para o equilíbrio das
sociedades, passadas ou actuais: as suas representações atravessaram os séculos
e os milénios, continuando a sensibilizar esteticamente as gerações do nosso
tempo, mesmo na ignorância total ou quase dos códigos utilizados, e dos contextos
em que foram geradas. Não sabemos quais as reais intenções dos artistas que
gravaram as figuras de animais nas rochas de Foz Côa (fig.1), mas essas
belas imagens tocam a nossa
sensibilidade muitos milénios depois da sua produção. O mesmo poderemos dizer
de outras obras de arte de todas as épocas, desde a já citada “Última Ceia”(fig.2)
às pinturas de Van Gogh (fig.3).
Se pensarmos que o património
artístico é parte fundamental da memória
colectiva de um povo e essencial para a afirmação da sua identidade cultural, não teremos
quaisquer dúvidas sobre o seu valor na
formação individual, muito especialmente numa época como a nossa, em que mais e
mais se esbatem as fronteiras políticas.
Mas tão importante como a
identificação dos estilos, das obras e dos artistas, é o conceito de Beleza, tão procurado por filósofos e
artistas, a própria Máscara da
realidade que a Arte acaba sempre por assumir, por muito “realista” que queira
parecer… Sem sensibilidade para as formas artísticas, para o seu conteúdo ou
códigos, é impossível qualquer aproximação ao fenómeno estético. Um indivíduo
que lhe seja insensível bem poderá “brilhar” em sociedade com o papaguear de
nomes, pinturas, esculturas, museus, sinfonias… Poderá ganhar concursos
“culturais” na televisão, na rádio ou na Internet… No fundo, não passará de um
ignorante pomposo… e quantos não haverá por aí?…
Como acontece com tudo o que diz
respeito à Cultura, é ao Ensino que cabe a principal responsabilidade numa
alteração radical deste estado de coisas. No fundo trata-se, “simplesmente”, de
pôr as pessoas a pensar!
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