sexta-feira, 6 de abril de 2018



EDIFÍCIOS CIVIS MANUELINOS 

DE TOMAR

Carlos Rodarte Veloso

“O Templário”, 5 de Abril de 2018

                    "Continua-se hoje a publicação de excertos do meu trabalho “Urbanismo e Arquitectura Civil de Tomar na Época da Expansão”

               As importantes mutações sociais verificadas no tempo de D. Manuel I teriam que se reflectir sobre a forma de viver e, portanto, sobre as construções.
               Vários edifícios públicos prestavam diversos serviços administrativos e sociais. É o caso dos Paços do Concelho, nascidos de um “assento de casas” mandadas fazer pelo rei, no lugar onde havia umas boticas do Infante D. Henrique. O edifício que chegou aos nossos dias não ostenta já características “manuelinas” pois sofreu uma série de transformações e obras em diferentes épocas, o que explica a sua feição maneirista. A galilé da frontaria e as arcadas das traseiras conferem ao conjunto uma dignidade muito consentânea com as suas funções cívicas.
               Também importante foi a criação da Misericórdia de Tomar, em 1510, com base no Hospital de Santa Maria da Graça, obra, como vimos, do Infante D. Henrique. Verificava-se então, neste caso graças à acção da rainha D. Leonor, uma crescente tomada de consciência dos governantes acerca das responsabilidades sociais do Estado.
               Mas é na casa particular e, muito especificamente, na casa nobre, que o surto económico nascido da expansão marítima, vai ter maior incidência.
               Na verdade, o que é válido para a arquitectura religiosa, em que se multiplicam os melhoramentos nas velhas igrejas, as mais das vezes através do abobadamento das capelas-mores ou colaterais ou da reconstrução dos portais ao gosto manuelino, é-o também para a arquitectura doméstica. Se são raros ainda, na província, os palácios de grande aparato, multiplicam-se os sinais exteriores de riqueza através da decoração de portas e janelas. Vergas recortadas, polilobadas, contracurvadas ou, simplesmente, adornadas com os motivos naturais manuelinos, dão carácter às primeiras fachadas quinhentistas. É tão forte a penetração deste gosto, que estas formas de natureza tardo-gótica se vão manter por mais de um século, apesar do mais erudito surto renascentista e sua consequência, o Maneirismo.



               Na antiga Judiaria, depois Rua Nova e hoje Rua Dr. Joaquim Jacinto, marcadamente burguesa, diversas janelas manuelinas ostentam as suas vergas recortadas. É assim a casa nº 40, com porta bem simples e janela de peitoril no 1º andar, com verga trabalhada e avental (Fig.1). Na mesma rua, a casa nº 63 ostenta, na verga da porta, dois compassos ladeando um círculo, símbolo decerto da profissão do proprietário, talvez um pedreiro.
               Na antiga Levada, hoje Rua Everard, já desapareceu a janela manuelina — e, decerto, a casa a que pertencia… — representada em desenho no Inventário de Matos Sequeira, editado em 1949.
               De uma outra janela de feitura mais elaborada, também manuelina e igualmente proveniente de um prédio da Levada, segundo Vieira Guimarães “ligado aos Cubos da Ordem de Cristo”, e desenhada por Albrecht Haupt, em 1888, nos dá conta o mesmo Vieira Guimarães que, para evitar que ela fosse “enriquecer o palácio do Marquês da Foz, em Torres Novas”, assim “desaparecendo de Thomar”,  a  mandou instalar na sua quinta de Marmelais de Baixo. Depois da sua morte, ruiu a casa da dita quinta e, com ela, a janela, desde 1961 arrecadada, como tantas outras cantarias, no Museu do U.A.M.O.C. (União dos Amigos dos Monumentos da Ordem de Cristo), no Claustro da Lavagem do Convento de Cristo ).
               Outras janelas quinhentistas, quer ao gosto manuelino, quer ao renascentista, muitas delas publicadas já por António Carlos Godinho, se podem admirar, em diversas ruas de Tomar, avulsas ou integradas ainda em boas casas do Centro Histórico. Também os revivalismos neo-manuelino e neo-renascença, prolongados muito para além do seu tempo próprio, ampliam a sugestão de intemporalidade que tantas vezes nos assalta ao percorrer as velhas ruas, não se distinguindo, por vezes, o antigo do “moderno”.


               Exemplo do Neo-Manuelino é a Casa Vieira Guimarães (Fig.2), construída entre 1920 e 1922 defronte da entrada leste da Ponte Velha. A sua torre octogonal parece ser réplica da torre manuelina da Igreja de S. João Baptista, como esta parece ser inspirada na Charola do Convento de Cristo.

Nota: Fotos de C. Veloso

Sem comentários:

Enviar um comentário